Nos primeiros meses após a aposentadoria, três anos atrás, Jon Helmuth dormia até tarde. Ficou bronzeado e tomava banho em horas estranhas. Na verdade, tinha dias em que nem tomava. Após esse intervalo agradavelmente desregrado, Helmuth, 45 anos, divorciado, pai de quatro filhos, começou a organizar a casa de cinco quartos em Vandalia, Michigan (EUA). “Mas assim que arrumei os condimentos em ordem alfabética e terminei de forrar uma poltrona com retalhos de jeans de grife, comecei a ficar sem ter o que fazer”, conta.
Quem se lembra do primeiro ano de aposentadoria talvez balance a cabeça conscientemente em solidariedade. Mas a situação é diferente quando você se aposenta muito cedo. A aposentadoria antecipada e uma vida de lazer parecem um sonho, mas a realidade pode ser chocante para quem está acostumado a uma vida ocupada e significativa. Pode haver tédio, uma sensação de isolamento e várias perguntas sociais desconcertantes.
Desimportante
Helmuth, por exemplo, tinha apenas 42 anos quando vendeu sua participação na Genesis Products, fábrica localizada em Elkhart, Indiana, que produz portas de madeira e laminadas, móveis e outros componentes, que ajudou a fundar, em 2002. “Eu costumava ser importante e agora não sou mais”, afirma, acrescentando que saiu da empresa com cerca US$ 5 milhões. “Não preciso voltar a trabalhar, contanto que não seja incrivelmente estúpido”, confessou ele.
Além disso, as pessoas que por ventura poderiam querer ajudá-lo a gastar esse dinheiro ou que talvez se ressintam de sua sorte tendem a estar ocupadas – trabalhando. “Tenho aquela sensação de que todos os meus amigos estão na escola e eu estou em casa doente. E não há asilos para pessoas com 45 anos.”
Aqueles que escolhem parar de trabalhar 10, 20 ou 25 anos antes do convencional raramente têm preocupações financeiras – caso contrário, presumivelmente, não o teriam feito. Viveram dentro de suas possibilidades e economizaram para se sustentar, ou, como Helmuth, venderam sua parte nos negócios. Às vezes podem ter recebido uma herança ou ter um cônjuge que ainda traz o salário para casa.
Mas eles têm outras preocupações: qual é a melhor resposta para os estranhos que perguntam nas festas, “Em que você trabalha?”. Como lidar com a curiosidade e a inveja dos outros? Que tipo de mensagem estamos passando para nossos filhos?
Culpa
Para Donna Buxton, que tinha um trabalho exigente na área de informática do setor de cuidados de saúde até sua aposentadoria, aos 46 anos, a grande questão era a culpa. Não importava que seu marido, Michael, que na época era presidente de uma indústria de forja, estivesse ganhando bem o suficiente para sustentar a família – o casal tem uma filha – e que a tivesse encorajado a parar.
“Eu tinha uma forte ética profissional e sentia que precisava contribuir para a família de forma financeira, mas meu marido me dizia a toda hora que não queria que eu trabalhasse por trabalhar – queria que eu o fizesse só se fosse muito apaixonada pela profissão”, diz Donna, agora com 55 anos e que mora em Villa Park, Califórnia.
Sua paixão havia diminuído devido à carga horária exigente de seu trabalho. “O nível de estresse estava tão alto que a família acabava pagando o preço; por isso decidimos que não valia a pena.” Desde que se aposentou, ela se envolveu em assuntos cívicos e se juntou a um grupo de golfe e um clube de saúde. Surgiram algumas ofertas de emprego. “Mas eu estava tão esgotada que recusei.”
Questões familiares
Para alguns jovens aposentados, os problemas familiares acabam gerando a decisão de sair da força de trabalho. Quando o casamento do Helmuth acabou, em 2012, ele sentiu que precisava de uma redefinição. “Não estava me sentindo bem em relação ao equilíbrio trabalho-vida. Meu sócio queria investir mais e expandir, e eu o encorajei. Acabamos nos separando amigavelmente.”
A situação pode ser particularmente preocupante para os jovens aposentados que trabalhavam em um negócio familiar bem-sucedido e que foi vendido antes da morte do fundador. “Tenho clientes de 35 e 40 anos que herdaram grandes somas de dinheiro e que não vão mais enviar currículos. Muitos deles andam de bicicleta ou jogam golfe e tênis porque seus contemporâneos estão trabalhando durante o dia”, diz Ricardo J. Armijo, vice-presidente e gerente de portfólio do escritório da UBS em Birmingham, Michigan.
Adaptação
Há um período de adaptação a essa nova realidade. “Mas depois de algum tempo, eles se acostumam com a nova situação de vida e os anos seguintes são muito gratificantes”, disse Armijo.
“Nunca quis voltar a trabalhar”, disse Sue Tafler, 69 anos, de Lexington, Massachusetts, que tinha 51 quando se aposentou da Prentice-Hall, onde era editora de livros didáticos, e se tornou voluntária em sua sinagoga. Mas reconhece que nem todo mundo é tão determinado: “Tenho amigos que já se aposentaram, mas arrumaram empregos de meio período porque não conseguem parar”.
Obviamente, ficar feliz com a aposentadoria é uma coisa, mas anunciar o fato com orgulho é algo completamente diferente.“Levei quatro ou cinco anos para dizer que estava aposentada. Eu dizia apenas: ‘Não estou trabalhando agora’”, afirma Donna.
Helmuth também vê um certo estigma na palavra. “As pessoas ouvem ‘aposentadoria’ e acham que você só joga golfe e tem um monte de passatempos bobos.” Pelo contrário, ele começou a produzir filmes, incluindo o documentário de 2015 The Flying Dutchmen, o relato de sua viagem de moto com um amigo que tem uma doença oftálmica degenerativa. “A aposentadoria começou como um período de férias e agora se tornou uma grande jornada de vida”, diz Helmuth.
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