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Fronteiras

As margens da ilegalidade

Estudo do governo federal aponta velhas deficiências nas fronteiras do país e cria, pela primeira vez, uma comissão para solucioná-las

Lago de Itaipu tem vários portos clandestinos e é um dos principais pontos de entrada de contrabando e drogas no Sul do país | Christian Rizzi / Gazeta do Povo
Lago de Itaipu tem vários portos clandestinos e é um dos principais pontos de entrada de contrabando e drogas no Sul do país (Foto: Christian Rizzi / Gazeta do Povo)

Um relatório do Ministério da Integração Nacional entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, neste final de mandato, recupera um antigo discurso criado para coibir a criminalidade nos 15,7 mil quilômetros da fronteira brasileira, que reúne 10 milhões de habitantes em 588 cidades e 11 estados: a necessidade de capacitar policiais e criar mais postos de segurança. Apesar de já conhecidas, as propostas custam para sair do papel, pelo menos na fronteira Sul do país, considerada porta de entrada para o contrabando e tráfico de drogas.

O documento de 140 páginas traz um panorama sobre a fronteira brasileira e apresenta 34 propostas para melhorar inúmeros setores, como educação, saúde e comércio. Feito ao longo de um ano, o relatório traz uma novidade: uma comissão permanente que promete colocar as propostas em prática a partir de 2011 (leia mais nesta página).

O relatório não traz detalhes sobre as falhas existentes na segurança, mas sabe-se que um dos pontos mais frágeis está nos limites de Brasil e Paraguai. Ambos os países não conseguem estancar remessas de armas, drogas e mercadorias contrabandeadas que passam pelo Rio Paraná e nos 1.350 quilômetros quadrados do Lago de Itaipu, entre Foz do Iguaçu e Guaíra. Um dos resultados visíveis é a existência de um conglomerado de portos clandestinos nas proximidades da Ponte da Amizade, entre Foz do Iguaçu e Ciudad del Este, e nas cidades da Costa Oeste, no lado brasileiro e paraguaio.

O Rio Paraná e o Lago de Itaipu são "portos a céu aberto", como define o delegado-chefe da Polícia Federal em Foz do Iguaçu José Alberto Iegas. Basta abrir um picada que já se tem uma passagem clandestina. A maior parte concentra-se nas cidades de Foz do Iguaçu, Itaipulândia, Entre Rios, Santa Helena e no entorno de Guaíra. Povoada por pequenos municípios que enchem os cofres com royalties da Itaipu Binacional, a Costa Oeste hoje se divide entre a zona turística e a clandestinidade.

Em Foz do Iguaçu há pelo menos cinco principais pontos para passagem de mercadorias, situados em bairros e favelas vizinhas à Ponte da Amizade. Cada portinho tem um nome de batismo, entre eles o Porto da Eva e o Porto do Ivo, e um comandante. A maioria deles foi presa pela PF, mas continua atuando porque foi enquadrada pelo crime de contrabando, cuja pena é atenuada.

Fiscalização

Com duas bases para segurança fluvial em Foz do Iguaçu e Guaíra, chamadas de Delegacias de Polícia Marítima (Depom), a PF atua noite e dia, mas não consegue parar o vaivém de barcos entre Brasil e Paraguai porque o efetivo é reduzido. A Marinha também faz patrulhamentos na área com foco na apreensão de embarcações irregulares. Em Foz do Iguaçu, a Depom tem mais de 18 lanchas, no entanto apenas 18 policiais no quadro. Quando estão em patrulha, os agentes conseguem barrar a passagem de mercadorias ilegais do Paraguai para o Brasil, mas como precisam se revezar para cumprir escalas, é impossível fazer um patrulhamento contínuo em toda área. "Com o tempo há um desgaste e estresse", diz o chefe da Depom, Augusto Rodrigues. Entre Foz do Iguaçu e Guaíra, o Lago tem 170 quilômetros em linha reta.

Na outra margem

No lado paraguaio, o cenário de portos não é diferente. Lá, a imprensa cansou de denunciar a existência deles, inclusive dando nomes: Kuwait, Codorzo, Índio, Palma, General Díaz, Limoy e assim vai. Mas as transações clandestinas estão longe de uma solução, pelo menos em curto prazo, porque, segundo jornalistas do país vizinho, por trás dos portos estão políticos e magistrados.

No Paraguai, as intervenções nos portos são feitas apenas quando há denúncias. E elas não são tão comuns assim. Pelas regras do país, as mercadorias que saem de Ciudad del Este, fronteira com Foz do Iguaçu, pela aduana, com destino ao Brasil, são consideradas legais. Quando destinadas a fins comerciais é preciso despacho de exportação. Porém o grosso dos produtos, em grandes quantidades, deixa o país pela porta dos fundos, via Rio Paraná e Lago de Itaipu. "Quando se ilude o controle da aduana a mercadoria também é considerada contrabando para o Paraguai", diz o chefe da aduana paraguaia, Adolfo Almirón. De forma geral, as deficiências de segurança, marcantes nos estados do Paraná e Mato Grosso do Sul, andam junto com elevadas taxas de atividades informais em cidades-gêmeas, como Foz e Ciudad del Este.

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