Ainda não se pode afirmar o motivo do rompimento das barragens Fundão, cujo volume de lama desestabilizou e estourou uma segunda barragem, a de Santarém, destruindo o distrito de 560 habitantes de Bento Rodrigues, na cidade de Mariana, em Minas Gerais. As estruturas das duas unidades, porém, eram consideradas de alto potencial de dano ambiental. As informações constam do Banco de Dados de Barragens da Fundação Estadual de Meio Ambiente (Feam) do estado, feito em 2014, e revelam que, apesar da classificação de alto risco, as barragens haviam sido consideradas estáveis depois de auditoria. Pelo menos uma morte está confirmada e 25 pessoas estão desaparecidas.
Para fazer essa classificação, são considerados cinco parâmetros: altura da barragem, volume do reservatório e ocupação humana, interesse ambiental e instalações na área na região abaixo da barragem. Em Minas Gerais, das 754 estruturas cadastradas pela Feam, 450 são de empresas que trabalham com mineração. O restante está vinculado a destilarias de álcool e indústrias. O levantamento mostra que em Mariana há 24 barragens ou diques relacionados à mineração. Das estruturas existentes na cidade, apenas duas, pertencentes à Vale, foram consideradas instáveis. A empresa Samarco Mineração – uma joint venture da Vale com a australiana BHP –, dona da barragem que se rompeu, teve sete estruturas liberadas. Apenas uma não recebeu classificação.
“Minas Gerais é um estado minerador e tem um know-how qualificado em construção dessas estruturas, mas eventualmente acontecem esses acidentes”, pondera José Francisco do Prado Filho, professor do departamento de Engenharia Ambiental da Escola de Minas, da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). O último acidente registrado foi em setembro do ano passado, em Itabirito (a 67 quilômetros de Mariana). O rompimento da barragem provocou o deslizamento de um grande volume de rejeitos de minério e lama, que atingiu veículos da empresa mineradora e matou três funcionários (relembre outros casos).
Extensão dos danos
A lama que estava acumulada na barragem de rejeito não é tão tóxica como se imaginava, segundo avaliação de dois especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo. Prado Filho explica que o minério de ferro, que era extraído no local, é pobre, com baixo teor de hematita. Ele passa por um processo de beneficiamento que utiliza água e substâncias químicas que não são perigosas. O principal rejeito é a areia de sílica.
“O problema é o material, uma lama densa e com elevada concentração de material particulado. Isso foi empurrando toda a vegetação que havia nos vales por quilômetros, o que causa degradação dos cursos d’água e vegetação do local”, analisa. Ainda na sexta (6), constatou-se que parte dos rejeitos desceu pelo Rio Doce e chegou a afetar uma usina hidrelétrica a 100 Km de Mariana. Para Prado Filho, a degradação é física e é difícil estimar quanto tempo levará para se retomar a normalidade –de cinco a dez anos, provavelmente.
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O professor do departamento de Geologia da UFPR Luiz Eduardo Mantovani explica que como o material que constituiu essa lama é quimicamente pobre ele prejudica zonas de cultivo e pode fazer com que as pastagens e a vegetação nativa levem mais tempo para se restabelecer. “Vai precisar de adubação e fertilização calcárea para ter atividades agrícola e pecuária de novo”, aponta. Ele ainda ressalta que a sílica, se aspirada, pode causar silicose, uma doença respiratória, mas que a possibilidade de isso ocorrer é remota, pois depende da combinação de vento e tempo seco, e a região é úmida. Já o contato da substância com o corpo pode causar irritações e alergias. Em casos mais graves, há registro de aparecimento de tumores.