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Plenário do Fórum da Barra Funda, na zona oeste, onde 26 policiais militares são julgados pelo caso que ficou conhecido há mais de 20 anos como o Massacre do Carandiru | Marcelo Camargo / Agência Brasil
Plenário do Fórum da Barra Funda, na zona oeste, onde 26 policiais militares são julgados pelo caso que ficou conhecido há mais de 20 anos como o Massacre do Carandiru| Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

O perito criminal Osvaldo Negrini Neto afirmou nesta segunda-feira (15) que a polícia não queria que fosse feita perícia no interior da penitenciária do Carandiru após o massacre que matou 111 presos em 1992. Ele era perito do Instituto Criminalística (IC) e disse que foi impedido de entrar no local após o crime. "Entrei, depois, escondido no carro de um delegado", disse. "Havia poças de sangue nas galerias. O sangue chegava na canela. Parecia uma enchente". Os corpos, disse ele, estavam nos corredores e não mais dentro das celas. Segundo Negrini Neto, essa movimentação dos cadáveres prejudicou o trabalho da perícia.

Ele disse ainda que voltou ao local no dia seguinte ao massacre e que encontrou o presídio modificado. "Ficou claro para mim que não queriam que fosse feita a perícia. O local foi lavado, as celas já estavam reorganizadas. A única coisa que não conseguiram mudar foram os indícios de marcas de bala nas paredes das celas", afirmou.

Negrini Neto relatou que chegou a pedir para que o local não fosse modificado, mas não foi atendido. Ele mostrou slides com imagens do laudo que produziu na época, entre elas imagens de corpos amontoados nas galerias.

Ele foi a quinta pessoa a ser ouvida nesse primeiro dia de julgamento. Arrolado pela acusação, ele disse que as armas entregues pela polícia à perícia tinham indícios de que tinham sido disparadas na época do massacre. Porém, não era possível dizer exatamente em qual dia houve os disparos.

Provas

As primeiras testemunhas de acusação no julgamento que começou nesta segunda-feira de 26 dos 79 agentes indiciados pelo "massacre do Carandiru" afirmaram que a polícia plantou provas falsas para justificar a morte de 111 presos. O ex-detento Antonio Carlos Dias, o primeiro a ser escutado na audiência, afirmou que a polícia "pôs armas nas celas" e que o número de mortos era tão alto que os detidos tinham que "escalar" os corpos amontoados no pátio número 9 da extinta penitenciária paulista.

A defesa alega que sem as provas técnicas de balística é impossível determinar que agentes dispararam e mataram, pois participaram da operação 284 policiais militares. Nenhum dos 284 agentes morreu, e os 11 feridos do organismo de segurança foram atacados com facas e pedaços de madeira, apesar de a polícia ter alegado que invadiu o complexo porque os detentos tinham armas de fogo.

A segunda testemunha, Marco Antonio de Moura, outro ex-detento, relatou por sua vez que teve que fingir estar morto, mas conseguia ver um dos agentes acusados matar com golpes de cassetete os presos que tentavam sair por um elevador e pelas escadas de emergência. "Ele (o policial) contava 1,2,3 e dava um golpe, e assim matou muitos no elevador, mas eles também faziam com que os cachorros mordessem muita gente", contou a segunda testemunha ouvida no primeiro dia do julgamento.

Moura também afirmou que a polícia perguntou aos presos reunidos no pátio por quem estava ferido, e muitos dos que levantaram a mão e que aparentemente não tinham lesões de gravidade depois apareceram mortos. "Graças a Deus não levantei a mão, pois quem a levantava foi levado e nunca mais visto com vida", disse o sobrevivente.

Está previsto que nos próximos dias compareçam outros ex-presidiários, juízes e o governador de São Paulo quando ocorreu o massacre, Luiz Antônio Fleury Filho. A Justiça processará 79 policiais em quatro fases, devido a seu alto número.

O coronel da Polícia Militar que dirigiu a operação, Ubiratan Guimarães, foi condenado em 2001 a 632 anos de prisão, mas nunca ficou detido e se dedicou à vida política como deputado estadual até 2006, quando foi absolvido em uma apelação.

Meses depois, foi assassinado em estranhas circunstâncias dentro de seu apartamento e sua namorada, a principal suspeita, foi declarada inocente do crime por falta de provas.

Além disso, o diretor da penitenciária na época do massacre, José Ismael Pedrosa, foi assassinado a tiros em 2005 após votar em um referendo sobre a proibição do comércio de armas de fogo no país. O complexo de Carandiru foi parcialmente demolido em 2002 para a construção de um parque ecológico, duas escolas técnicas e uma biblioteca.

Julgamento retomado

O julgamento do massacre do Carandiru foi retomado nesta segunda-feira (15), a partir das 10h30, no Fórum da Barra Funda, em São Paulo. Inicialmente programado para o dia 9 de abril, o julgamento precisou ser adiado após uma das juradas passar mal. O Tribunal do Júri irá definir o destino dos 26 policiais militares acusados de matarem 15 detentos do 9° Pavilhão da Casa de Detenção de São Paulo, em outubro de 1992.

Antes do início dos trabalhos desta manhã, o juiz José Augusto Nardy Marzagão sorteou os sete novos jurados. Seis homens e uma mulher compõe o júri, o que dá uma ampla maioria masculina. Na semana passada, haviam sido sorteados cinco mulheres e dois homens. Os jurados terão 40 minutos para a leitura das peças processuais do caso.

O deputado Major Olimpio Gomes (PDT-SP), da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa, diz ter certeza da absolvição dos réus. "Eles agiram no estrito cumprimento do dever legal. Aqueles que enfrentaram a polícia foram feridos ou mortos. Havia mais de mil presos no local". A imprensa não foi autorizada a entrar no plenário.

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