Uma das mais importantes etapas no processo em que a equipe da médica Virgínia Soares de Souza responde por abreviar sete vidas na UTI do Hospital Evangélico de Curitiba terminou na segunda-feira (17). O Ministério Público do Paraná entregou as alegações finais à 2ª Vara do Júri de Curitiba e pediu a pronúncia por homicídio doloso duplamente qualificado e formação de quadrilha de cinco dos sete acusados.
“A gente entende que todas as acusações foram comprovadas. Pela comprovação da perícia, análise científica, depoimentos de testemunhas mostram isso”, afirmou a promotora Fernanda Nagl Garcez, uma das responsáveis pelo caso. Os episódios suspeitos vieram à tona em 2013, após uma investigação do Núcleo de Repressão aos Crimes Contra Saúde (Nucrisa), da Polícia Civil.
Se a Justiça pronunciar os réus, o júri popular pode ser marcado. Mesmo assim, as partes poderão ingressar com recursos contra ou a favor da decisão final do magistrado de primeiro grau. Agora, porém, as defesas têm 20 dias para protocolar suas alegações finais assim que forem notificadas dos prazos.
Os promotores pediram a impronúncia de uma fisioterapeuta e um enfermeiro que eram acusados de formação de quadrilha no caso por não haver indícios suficientes do envolvimento deles nos supostos crimes.
O MP acredita que a equipe da médica antecipava as mortes dos pacientes para abrir vagas na UTI daquele hospital. Na época das investigações policiais, interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça mostraram conversas dela mencionando que não adiantaria “entulhar a UTI” e ressaltando que tinha que “girar”, uma suposta referência à liberação de vagas e até perguntando se determinado paciente “já tinha ido”, e em outro momento dizendo que “já tinha ido com dois”.
“Kit morte”
Segundo as alegações do MP acessadas com exclusividade pela reportagem da Gazeta do Povo, a instrução do processo conseguiu, em tese, mostrar que, sob a liderança da médica Virgínia, a equipe aplicava medicamentos bloqueadores neuromusculares, conjugados com fármacos anestésicos, que levavam pacientes naquele estado à morte. Esse grupo de medicamentos foi chamado de “kit morte” nas alegações finais.
“Cabe, aqui, bem frisar, que esses medicamentos podem ser utilizados juntos, mas não nas doses prescritas às vítimas, nem ministrados ao mesmo tempo. O correto, a se considerar presente a hipótese de um paciente estar “brigando com o respirador” – o que não é o caso de nenhuma das vítimas desta ação penal -, é iniciar a administração com o sedativo; aguardar; ministrar o analgésico; esperar novamente, para, aí então, ser dado o bloqueador neuromuscular”, explicou o texto das alegações.
Além das aplicações dos medicamentos, a ventilação mecânica era diminuída. O MP alega ainda que havia certa estabilidade nos pacientes, mesmo nos casos com gravidade, mas não houve nada que justificasse a aplicação dos medicamentos.
O MP frisou também, no documento, que não se surpreende de que as defesas tenham levado tantas pessoas que afirmaram não ter conhecimento sobre as mortes denunciadas naquela UTI em razão da atuação “peculiar” do grupo ser considerada de altíssima espacialização.
“Justamente pela facilidade de se travestir essas condutas como práticas médicas, ainda mais em uma unidade de cuidados intensivos, em que o aporte tecnológico é alto, em que a prática médica é altamente especializada, e em que de fato pacientes acabam morrendo, é que os réus conseguiram manter essa associação estabilizada e em franca atuação”, afirmou o texto dos promotores.
Outro lado
O advogado da médica Virgínia, Elias Mattar Assad, afirmou que as alegações finais do MP provaram apenas que sete pessoas morreram nas UTIs. “Morrer não é crime. Crime é matar e disso não há prova sobre quem, quando e como (alguém foi morto). Não há prova da existência de um único fato criminoso”, disse o advogado. Segundo ele, todos os atos estão previstos na literatura sobre medicina legal. “Estamos com a esperança que as nossas defesas convençam a Justiça que ela seja absolvida sem a necessidade de júri”, afirmou.
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