Um leitor observa que os jornais "não são afeitos ao uso da mesóclise". É verdade. Podemos, aliás, estender essa observação a quase todas as situações de uso da língua escrita. Às vezes lemos centenas de excelentes páginas e não encontramos uma mesóclise sequer.
Mas vejam bem: não que a mesóclise tenha desaparecido completamente, que seja uma forma errada. Apenas deixou de ser produtiva. Talvez por ter sido e estar sendo interpretada pelos brasileiros como uma forma esquisitona, complicada. Aí os falantes sempre dão um jeito, acham na própria língua uma saída também produtiva.
Aos leitores que já apagaram a mesóclise da mente, segue uma pequena revisão. No capítulo "colocação de pronomes pessoais átonos", ou mais adequadamente de posicionamento dos clíticos (o, lhe, te, se, me, vos), aprendemos que esses itens podem ocupar três posições em relação ao verbo: antes (próclise), depois (ênclise) e no meio (mesóclise). Um exemplo de próclise: Não ME peça nada. De ênclise: Diga-ME a verdade. De mesóclise: Escrever-LHE-ei todos os dias. Uma observação: muitos linguistas, a exemplo de Perini, defendem que a mesóclise é apenas um caso especial de ênclise.
A mesóclise ocorre apenas quando temos verbo no futuro de presente do indicativo (escreverei) ou do pretérito (escreveria). Note-se que se trata de um fenômeno muito restrito, facilmente contornável, digamos assim. Ao contrário da ênclise e da próclise. A frase "Escrever-lhe-ei todos os dias" pode ser remanejada para "Vou te escrever todos os dias" ou "Vou escrever a/para você todos os dias".
O fato de não se usar mais a mesóclise não significa não gostar dela, ter uma queda, ou mesmo uma paixão desenfreada por essa forma que expira como o pretérito mais-que-perfeito (amara, vendera, sucedera...).
Quando bater a saudade, é só fechar o jornal e pegar um livro de Graciliano Ramos, que não poupou em mesóclises e mais-que-perfeitos.
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