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Cristovão Tezza

Jogador ou escritor?

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Uma das muitas perguntas idiotas e indagações de boteco que me vi fazendo durante minha trágica imersão total na Copa do Mundo foi esta: é melhor ser escritor ou jogador de futebol? Perguntar e coçar, é só começar. As coisas mais sem pé nem cabeça tomam um ar racional e, deixadas ao acaso, logo se transformam em teses de doutorado com voto de louvor. Sem chegar a tanto, no limite da minha ressaca futebolística e crônica carência de imaginação, vou tentar desdobrar essa dúvida transcendental.

Comecemos pragmaticamente: jogador de futebol ganha mais que escritor, em qualquer caso, mesmo perdendo de 7 a 1 ou batalhando na Série C, desde que tenha uma carteira assinada pelo cartola do time. Escritor, como tal, não ganha nada de ninguém; nunca é confiável ou previsível e todas as equipes o evitam. É o tipo do sujeito fominha, que quer fazer gol sozinho e levar a bola para casa. Por isso mesmo, de fato, o escritor é alguém que escolhe trabalhar de graça, e ainda assim, no início, nenhum editor, ou cartola literário, quer saber dele. O que já deveria ser motivo para internação, mas, por força do mesmo pensamento mágico que protegia os loucos na Idade Média, a sociedade atual prevê encontros de proteção ao escritor, quando ele é convidado a explicar-se diante de uma plateia rala. O que ele faz, verdade seja dita, com bastante dificuldade.

Um jovem jogador é sempre valioso; já aos 18 ou 19 anos ele é tratado como rei. Mas um escritor jovem é uma figura chata, irrelevante, depressiva, que produz pouco e mal, e vive no mundo da lua – e sua única coroa é o rei na barriga. Entretanto, à medida que rola o tempo, o escritor passa a ser valorizado – aos 30, 40 anos, basta um gol bonito, digo, um bom livro, para ele começar a ser percebido com olhos otimistas. Com o jogador, ocorre o contrário. Depois dos 35, quando passa a receber homenagens, sua carreira está no fim. Se não fez seu pé de meia, sua vida vai recomeçar do zero. Outra diferença é que o bom jogador estreia jogando e acaba comentarista de futebol na tevê; já o bom escritor começa como comentarista de livros em mesas de bar e acaba escrevendo.

Quanto à popularidade, nem se comparam. Jogadores ruins levam num estalo de dedos 30 mil espectadores ao estádio num domingo, a pelo menos 50 paus por cabeça. Já os melhores escritores mal juntam 3 mil leitores, ao longo de anos, que pagam reles 30 pilas o exemplar e ainda resmungam que está caro. Mesmo os Messis das letras, com final de Copa, digo, com prêmio Nobel nas costas, jamais enchem uma arena. E as vantagens do jogador de futebol vão além. Quando acaba a vida nos gramados, ele pode se tornar escritor; já um escritor que decida encerrar a carreira nunca virará um jogador. Quarenta e cinco anos atrás, alguém me disse que eu até teria futuro como lateral-direito, mas não levei a sério. Agora é tarde.

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