O título que escrevi de um rompante para inventar uma crônica soou nos meus ouvidos como a letra de uma música sertaneja, o verso orgulhoso e colorido no para-choque do caminhão rodando pelas estradas do Brasil. Mas viagem é mesmo destino, e elas me marcaram, desde a primeira, que me trouxe a Curitiba, de onde várias vezes tentei sair e para onde sempre voltei, invencível curitibano. Hoje, sair daqui de casa até o Centro já me parece uma arriscada aventura de Odisseu neste mundo frio, chuvoso e sem porteira.
Mas nem sempre foi assim. A minha geração queria mesmo viajar, em todos os sentidos. Mesmo com a bossa nova e as alegres malemolências do inocente Brasil daqueles tempos, em que para viajar não era preciso se mover (bastava um fuminho, o prolongamento psicodélico do velho cigarro de "paia" nos pés do chão da casinha de sapé), o país que nascia nos anos 60 ainda era um imenso Maranhão. Nos anos 70, um Maranhão tocado por milicos; nos anos 80, tangido pelo próprio Sarney. E para quem queria, como eu, ser escritor, artista, poeta, ator, o que pintasse de diferente, contestador ou revolucionário, era preciso largar a família e viajar, e quanto mais longe melhor. Ia e voltava, o elástico do estilingue jogando longe e trazendo de volta. Fui para a Europa, ver o Brasil do lado de fora, e depois para o Acre, para vê-lo bem de perto e sempre voltei a Curitiba, que no imaginário do país parece que continua lembrando um não Brasil, o que seria uma estranha qualidade do país dos contrastes.
O Brasil adora amar Curitiba, a cidade que, proporcionalmente, ainda tem menos táxis que a brava Teresina, capital do Piauí, e que vê na mobilidade urbana o seu orgulho. E nossa página policial prossegue inteirinha brasileira, de alto a baixo, das altas tribunas ao balcão do boteco. De qualquer forma, há esperança, como lembrou um cearense em visita: aqui as calçadas são limpas e vocês respeitam fila! É um bom começo.
Voltando a viajar: pois depois que virei professor, seguro pelas colunas da Federal, acomodei-me por anos, mestre-escola tranquilo. O mundo, confortável, tinha 500 metros de diâmetro quem precisa de mais? E o olho de imigrante confere todo dia se a cerquinha está firme.
Mas, como meu destino é viajar (existe mesmo uma música com essa letra? Fiquei intrigado), logo voltei à rua e pus de novo o pé na estrada, o que me reanimou por uns tempos. De tal maneira que meu grande sonho de consumo passou a ser, de novo, ficar em casa hoje é tudo moderno e não precisamos de nada para viajar.
Mas lá vou eu: semana que vem desembarco em Frankfurt, para participar da maior feira de livros do mundo, no ano em que somos o país homenageado faço parte de uma caravana de 70 escritores brasileiros. É a total decadência do anarquista: nunca pensei que um dia eu fosse representar a Pátria, agora desgraçadamente sem chuteiras.