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Avatar é desses filmes que me dão vontade de dizer que não vi e não gostei. Quanto mais leio críticas e referências, mais cresce minha má vontade. Que a história é idiota, isso sabemos todos – afinal, para isso servem os blockbusters: levantam aquela poeira e não fica nada no cérebro de ninguém. Se o leitor já viu, vamos ver se acertei: vilões nítidos, mocinhos à toda prova, uma história de amor perdida nos escombros. Já me disseram também que há um toque anti-imperialista no filme – acho que Hollywood deve ter se rendido ao charme latino de Hugo Chávez. Defende-se também a vida natural, é claro. Milhões de espectadores entopem os shoppings de carros para ver o filme e saem das salas com o sorriso beatífico de quem rendeu culto à natureza. Ao mesmo tempo, recursos artificiais de última geração realizam o sonho da imagem em terceira dimensão: "Parece de verdade".

Tudo bem – o leitor dê o desconto; estou só exercendo o direito biológico-constitucional de ser rabugento depois dos 50 anos. Vamos ficar nesse aspecto mais frio – os efeitos em três di­­men­­sões que começam enfim a realizar a utopia da "falsa realidade". Consta que quando os irmãos Lu­­mière projetaram a clássica chegada de locomotiva, no primeiro filme da história, parte da plateia saiu correndo apa­­vorada, como se a imagem trêmula em preto-e-branco projetada na tela fosse mesmo um trem de verdade.

O cinema, pelo poder fantástico da fotografia que se move, potencializou a ilusão da representação a um grau jamais al­­cançado pelas outras artes. Co­­mo metáfora, podemos dizer que o que era "leitura", um processamento mental, abstrato, transformador, passou a ser percepção instantânea, um ato quase que puramente sensorial que se esgota em si mesmo. No romance Admirável mundo no­­vo, a obra-prima de Aldous Hux­­ley publicada em 1932 e que parece ganhar atualidade quanto mais passa o tempo, o cinema tinha essa função puramente sensorial – ver um filme equivalia a participar de uma divertida sessão de montanha-russa. Não é nem o clássico escapismo de quem precisa curtir uma comédia romântica de final feliz para aliviar as tensões da vida; é pura experiência epidérmica mesmo. Será esse o destino do cinema?

Eu vejo um outro caminho: o lado performático do cinema que deseja fundir o espectador na obra, tem a contrapartida guerrilheira do computador, do celular, do filme visto em casa em escala pequena (ou mesmo nas telonas de parede) – o que muda inteiramente a lógica da recepção. A multiplicação de opções via internet fazem do filme um "texto" a ser lido individualmente – dá para "voltar a página", reler uma cena, in­­ter­­romper a leitura, como se o filme fosse um livro. E com a vantagem adicional de que em casa não há em torno aqueles chatos barulhentos comendo um balde de pipoca e narrando as cenas do filme.

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