Assumir o governo é relativamente fácil. Muitas vezes nem mesmo é preciso ser eleito para o cargo, como é o caso de Michel Temer. O mais difícil é escolher os ministros e seus principais auxiliares.
“Depois é que são elas!”– dizia o empresário Luiz Fernando Arzua, o melhor amigo e o grande personagem das crônicas do advogado e jornalista Nireu Teixeira. Afora outras afinidades (uma delas o bom caráter), os dois tinham em comum a arte de contar histórias, fazer amigos e agregar pessoas. Hoje a silhueta de Nireu está sentada no Palco do Chorinho da Praça Garibaldi, com o invisível Arzua ao lado.
Modéstia à parte, digo eu: caprichava na letra, porque de graça – e com graça –, ouvia o rosário de causos
Das poucas diferenças entre Arzua e Nireu é que este era prosador também da palavra escrita e aquele deixava a caneta a cargo dos amigos. O que foi o meu caso. Nas inesquecíveis oportunidades em que tive o privilégio de sentar àquela mesa de prosadores, noite adentro cumpria o papel de ouvinte aplicado e, a pedido, servia de calígrafo para os cheques de Luiz Fernando. Já fora de prumo, no fim de noite ele me passava a caneta e o talonário, não sem antes anunciar aos que ainda restavam à mesa: “Modéstia à parte, tenho um cartunista para preencher meus cheques!”.
Modéstia à parte, digo eu: caprichava na letra, porque de graça – e com graça –, ouvia o rosário de causos que até hoje guardo na memória. Não todos, pois a minha fiação já está um tanto avariada, mas quando lembrar é preciso, recorro aos livros de Nireu Teixeira.
Como este episódio na casa do empresário Atílio Comodo, no prolongamento de um jantar, quando criticavam a dificuldade de um governador recém-eleito na escolha do secretariado. Arzua ponderou que não era assim tão fácil montar uma boa equipe: “Vamos imaginar que nós ganhamos as eleições e temos que compor a máquina do governo. Quem escolheríamos?”. Abriram mais um vinho e começaram a pensar em nomes e em cargos. No começo a coisa foi fácil, mas num determinado momento os nomes começaram a escassear, conta Nireu Teixeira.
Foi quando Arzua lembrou: “Que injustiça, esquecemos o Ivan Xavier Viana. Vamos nomeá-lo secretário de Finanças”. O Atílio pensou um pouco e ponderou: “O Ivan é muito complicado. Ele não aceita”. Só havia uma maneira de saber: telefonar para o Ivan. O Arzua não teve dúvidas. Embora fosse madrugada, ligou: “Olha, Ivan: o Atílio e eu estamos organizando o próximo governo. Queremos saber se você aceita a Secretaria de Finanças.”
“É isso que eu ganho após tantos anos de lealdade ao partido? Vocês sabem que quem controla as verbas é a Secretaria do Planejamento. Não! Muito obrigado!”. “É bom você decidir logo – insistiu Arzua –, restam poucos cargos”. O Ivan, porém, se manteve irredutível. Escolheram outro. Quando o secretariado estava quase completo, o telefone tocou: “Alô, Arzua, aqui é o Ivan. Vocês já preencheram Recursos Humanos?”.
De tanto ouvir os mestres prosadores, aprendi que boas histórias devem ser servidas ao ponto, feitas com ingredientes do quintal, na cozinha de casa. Um caso puxa outro, sem perder o fio da meada.
Neste sábado, por exemplo, Carlos Fernando Mazza – o Mazzinha – será empossado prefeito da República de Curitiba. Eleito pelo Partido do Pão com Banha, os festejos serão realizados no restaurante do Passeio Público. Durante uma “costela de fogo de chão”, os abraços ao escritor Toninho Vaz que nos visita, as libações de praxe e os embalos de Celso Piratta com sua Banda Provisória do Ahú, Mazzinha vai nomear o rol de notáveis amigos para o secretariado. Será uma tarefa das mais difíceis, tão difícil quanto a de Michel Temer.
Depois de tantas manhas e artimanhas, governar é que são elas! – diria hoje Luiz Fernando Arzua.
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