Correr ou parar? Ou ainda: quando parar e quando correr? Grande parte das aflições da modernidade está encerrada nesse dilema. Em um mundo cada vez mais competitivo e tecnológico, a velocidade se impõe como um imperativo. Não só no ambiente econômico e de trabalho, mas muitas vezes também nas relações pessoais. E, embora estejamos sempre em busca de algum sentido permanente à existência, tudo tende a mudar rapidamente.
Vivemos como se estivéssemos em um carrossel em aceleração, onde a paisagem passa e mal conseguimos notá-la. E onde tudo volta sempre ao mesmo ponto sem uma explicação: qual o sentido de tanta pressa?
Mesmo sem resposta, acabamos por correr para entrar e estar nesse carrossel. Corremos para nos atualizar. Corremos para chegar à frente do outro e ocupar um espaço. Enfim, corremos para ganhar a vida ainda que, se pararmos para pensar, a vida em si já está ganha por simplesmente estarmos vivos.
É emblemático ainda que a ciência seja o motor desse carrossel alucinado. Com as descobertas científicas fantásticas e as traquitanas fabulosas inventadas a partir dos novos conhecimentos, ganhamos tempo. Mas, num paradoxo, não conseguimos ter descanso, pois ocupamos as horas potencialmente livres com outras formas de ganhar tempo.
E a ciência, apesar de ser boa para acelerar o mundo e explicar como ele é, não serve para dar-lhe um sentido. Isso cabe a nós. E esse significado só pode ser apreendido pela contemplação e reflexão. Mas, para isso, é preciso parar. Algo difícil, embora necessário, em uma existência veloz. Lutamos contra a lei da inércia, que teima em deixar as coisas como estão. Afinal, é arriscado descer do carrossel em movimento.
Há, porém, formas de escapar da realidade que se impõe a nós. Desde os tempos imemoriais, alguns acorrem à religião. Outros à filosofia. E também à arte. É por isso que é bom ouvir (ou ler) o que dizem os artistas em suas mais variadas formas de expressão.
Um deles, o escritor português Gonçalo M. Tavares, em uma surpreendente entrevista ao Caderno G do último domingo, dessas que merecem ser guardadas e relidas de tempos em tempos, fez uma memorável análise de como enxergar a beleza da vida é preciso reparar. E ele lembrou que a palavra reparar traz em si esse ensinamento: reparar não é apenas parar; é parar e parar de novo para contemplar algo. E, assim, quem sabe, encontrar nele o belo. E, diz Tavares, reparar é também consertar algo que estava estragado. Como a nossa capacidade de encontrar um sentido em meio à correria do dia a dia.
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