As luzes do entardecer são especiais. Oblíquas, tingem de um suave dourado aquilo que tocam. Tal qual um Midas livre da maldição de transmutar tudo sem chance de arrependimento, elas pintam o ambiente de efêmero ouro. Efêmero e raro. Tesouro precioso que só pode ser apreendido por uns poucos instantes e que logo escapa da vista.
Talvez haja vozes dissonantes que prefiram a beleza do amanhecer. E clamem pela igualdade da alvorada ante ao entardecer. Impossível equipará-los, porém. Se as luzes da tarde e da manhã se equivalem na materialidade nua e crua, nossa percepção trata de torná-las diversa. O clarear matutino nos pega de surpresa. Os olhos desacostumados à luminosidade nos impedem de notar tão bem as nuanças de cor. Ponto para o entardecer.
Os detratores poderão se contrapor e dizer que, próximo do ocaso do dia, o crepúsculo vespertino flerta perigosamente com a noite escura. Luzes de despedida é o que elas de fato são. Mas, afinal, não é mais doce aquilo de que se gosta e que caminha célere para o fim?
Aliás, se a vida se espremesse num dia, o entardecer seria a maturidade do homem. Mais perto do derradeiro, mas plena de um brilho variado que só ela tem: a experiência. Também há diversidade na luz da manhã, assim como na infância e juventude. No entanto, a sonolência do despertar matutino dificulta a contemplação dos primeiros raios do sol tanto quanto a tenra idade carece do discernimento que só o tempo nos lega.
Num mundo em que todos desejam permanecer absolutamente jovens, um intento tão fadado ao fracasso como aprisionar feixes de luz entre os dedos, sentar para assistir ao pôr do sol pode ser libertador.
E talvez não haja melhor época para admirar o entardecer do que o outono que agora começa. Porque a própria luz desta época é especialmente diferente, mais obtusa, já que o sol se inclina ao Norte em sua trajetória celeste. Porque o outono simboliza a maturidade nos arquétipos humanos.
Do mesmo modo que nossos cabelos embranquecem e ficam ralos com o correr dos anos, as folhas das árvores perdem o viço verde, amarelam e depois caem para ser varridas pelo vento na estação dos frutos maduros. O calor também já está indo embora e deixa saudades, tal qual o fervor e a intensidade da juventude. Mas os entardeceres do outono (e a maturidade) têm suas compensações: são dourados como nenhum outro.
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