O curitibano acostumou-se às inovações urbanísticas. Desde que o atual Plano Diretor da cidade foi concebido, em 1965, a capital paranaense viu nascerem as canaletas exclusivas para os ônibus, a transformação de ruas destinadas aos carros em calçadões para pedestres, a criação de uma extensa rede de ciclovias e a implantação dos parques às margens de rios para evitar a ocupação humana e, consequentemente, tragédias decorrentes das cheias.
Essas ações urbanas, amplamente consagradas na capital, de certa forma resumem o espírito do planejamento que a cidade adotou. Por um lado fica claro, como princípio norteador do crescimento de Curitiba, o respeito à natureza e o reconhecimento de que ela é mais forte que os homens. Do outro, há claramente uma escolha política de priorizar o coletivo sobre o individual e o ser humano sobre as máquinas.
A partir dessas linhas gerais, muitas outras novidades foram sendo agregadas ao cotidiano da cidade, tais como o ligeirinho e o programa de separação do lixo reciclável projetos que saíram das pranchetas na década de 90.
Mas a impressão que se tem atualmente é que, embora o Plano Diretor se mantenha o mesmo por mais de quatro décadas, a alma do planejamento curitibano vem sendo desvirtuada.
A abertura de novas ruas e a implantação de binários para desafogar o tráfego de carros, por exemplo, têm sido marcas das últimas gestões. Talvez essas obras tivessem mesmo de ser feitas, diante do crescimento vertiginoso do número de veículos. Mas chama a atenção o fato de que, no mesmo período, não se tenha aberto vias exclusivas para o transporte coletivo na mesma proporção. Parece que o automóvel está, enfim, substituindo o ônibus como veículo a ser priorizado embora o discurso oficial seja o contrário. É a vitória do individual sobre o coletivo.
As dimensões humana e ecológica do planejamento curitibano também parecem estar sendo esquecidas. A cidade não tem ganhado pontos públicos de convivência com a mesma frequência que ocorria, por exemplo, nos anos 90. Naquela época, o curitibano se admirava com a rapidez com que surgiam espaços públicos de lazer: Jardim Botânico, Ópera de Arame, Pedreira Paulo Leminski, Tingui, Tanguá, Universidade Livre do Meio Ambiente.
Esses e outros parques conjugaram, em um só espaço, dois princípios do ordenamento urbano tipicamente curitibano o ambiental e o humano. Afinal, eles não são apenas locais de encontro de pessoas, mas promovem a preservação da natureza e contenção de enchentes.
Aliás, os alagamentos que têm atingido pontos da cidade, principalmente no verão, comprovam que há falhas no planejamento ambiental. A cidade vem crescendo sobre áreas verdes, ocupando áreas ambientalmente frágeis, construindo cada vez mais imóveis e impermeabilizando o solo. É a fórmula que sempre se tentou evitar.