A divulgação de documentos sigilosos da diplomacia dos Estados Unidos pelo WikiLeaks colocou as nações ocidentais em uma encruzilhada. O caminho que for trilhado a partir de agora pode fortificar as democracias ou representar uma perigosa inflexão rumo ao autoritarismo.

CARREGANDO :)

Por um lado, nunca se esteve tão bem informado acerca dos bastidores das relações internacionais. Nesse sentido, o vazamento de dados governamentais mantidos em segredo pode ser interpretado como uma radicalização da transparência do poder público, tão cara aos regimes democráticos.

Se a democracia é por definição o governo do povo, os cidadãos têm o direito de saber o que fazem as autoridades. E o aparato governamental não pode esconder o que deveria ser público – a não ser que a sociedade concorde em manter em segredo determinados tipos de informação por motivos de segurança de Estado.

Publicidade

Mas, ainda que o WikiLeaks possa de fato rumar para o perigoso caminho de divulgar dados que efetivamente coloquem em risco a paz internacional, o sigilo da maior parte do que se viu até agora no site não assegurava exatamente a segurança de Estado. Garantia sim a reputação de autoridades que não raras vezes agiam em benefício de empresas privadas e contra a lei e os direitos humanos.

Portanto, o que o WikiLeaks vem fazendo é forçar uma discussão que pode levar ao aperfeiçoamento da democracia. Aos governos resta optar por dois caminhos: um é aceitar esse debate e abrir-se à sociedade, buscando redefinir os limites dos segredos e as formas de controlar as autoridades. Outra possibilidade é o Estado se fechar, dificultando ainda mais o acesso a dados e tentando defender o interesse de governos que parecem estar cada vez mais dissociados das sociedades que representam. Se a escolha for pela segunda hipótese, a democracia subirá um degrau em direção ao cadafalso.

Infelizmente, a "caça" a Julian Assange, o fundador do Wiki­­Leaks, parece indicar que as autoridades optaram por tentar manter o status quo, num rumo temerário à democracia. Assange passou a ser perseguido pela Interpol e teve contas bancárias bloqueadas. Seu site foi alvo de hackers e acabou sendo temporariamente tirado do ar por provedores privados de internet, supostamente por pressão de governos. Mas a única acusação formal a que responde é por estupro na Suécia. Ainda que Assange seja culpado, a reação contra ele tem sido desproporcional.

Os Estados Unidos também buscam de todas as maneiras encontrar um ato ilegal cometido pelo WikiLeaks para incriminar Assange – que, em princípio, não praticou nenhuma irregularidade ao receber informações de um servidor público e divulgá-las, um direito que a 1.ª emenda à Constituição americana lhe garante.

É preocupante ver que uma parte expressiva do chamado mundo livre pareça estar pondo seus valores de lado para constranger um homem que radicalizou um princípio da democracia. Em um planeta em que cada vez mais países autoritários estão se tornando potências, a tentativa de calar o WikiLeaks é um mau presságio.

Publicidade