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A lei antifumo de Curitiba ainda não completou um mês, mas já cabe um balanço. Sugestão do Beronha, que desistiu de virar escritor. Optou por ser especialista. É o caminho mais fácil para ficar famoso. "Especialista sai todo dia em todos os jornais do país. E na televisão", explica. Será um especialista em qualquer assunto, mais os conexos e derivados. Basta convocá-lo que comenta, analisa, interpreta, explica e dá orientação sobre o que for, de fissão nuclear e ventos a bombordo à importância da bequilha na sustentação da aviação mundial. Não, minha senhora, não é braguilha, é bequilha mesmo, aquele componente com rodinha que fica sob o bico e a traseira de aviões, esclarece Natureza Morta, este sim, um especialista. Especia­lista em beronhices.

Voltando à lei antifumo, ou ao exercício da intolerância. Como disse o crítico (de cinema) Luiz Zanin, ao comentar o filme É Proibido Fumar, "na nossa época neopuritana até mesmo o ato prosaico de acender um cigarro passou a ser visto como uma transgressão". Até agora, o único resultado visível é o entupimento de bueiros próximos a bares, botecos e similares pelo tsunami de guimbas ou bitucas. Outro, pouco visível, é a duplicação do lucro dos fabricantes, já que a turma sai da mesa, vai à rua e, parecendo que vai tirar o pai da forca, queima no máximo meio cigarro. Resultado: quem comprava um maço passou a comprar dois para completar a cota diária de nicotina (0,7 mg), alcatrão (7 mg) e monóxido de carbono (9 mg), e se manter vivo, já que, segundo os mais inveterados, sem a tal ração guerreira, "cairia na hora, mortinho da silva".

Do outro lado do balcão, os proprietários arrancam os cabelos. O movimento aponta queda. Mas não só por isso. Muitos deles também são fumantes. E não podem largar o caixa ou a bandeja para ir fumar na esquina, caso do Pedro Barbosa, que é, aliás, além de amigo, excelente garçom.

Uma exposição de cartazes ajudou a esquentar o debate. A mostra "Propagandas de cigarro – como a indústria do fumo enganou as pessoas", com apoio do Instituto Nacional do Câncer (Inca), percorre capitais. Ficamos sabendo que, na década 50, até bebês, médicos e Papai Noel viraram garotos-propaganda. "A estratégia era fazer do cigarro um elemento essencial do cotidiano: do trabalho, dos jogos, da amizade, das férias e, especialmente, do amor", diz o professor e médico Robert Jackler, da Universidade Stanford.

Um dos "anúncios" (ou "reclames", como se dizia) garante que "mais médicos fumam Camel do que qualquer outra marca"; outro sugere: "Dê férias para a sua garganta, fume um cigarro refrescante". Ídolos reforçavam o coro: Frank Sinatra, Henry Fonda e Babe Ruth, "o melhor jogador de beisebol de todos os tempos" (confere, Flavinho, do Luzitano?)

Hoje, o palco é diferente. Descem o sarrafo no cigarro, nos fumantes, mas estimulam, direta e/ou subliminarmente, o consumo de outras drogas. A antifumo lembra a lei seca das eleições, só que driblar a fiscalização do TRE era por pouco tempo e mais fácil.

Agora devidamente instalado em cima do muro, Beronha acende o "palhova" e começa a cantarolar um sucesso de Dalva de Oliveira:

– Fumando espero/aquele (a) a quem mais quero (...) enquanto eu fumo/depressa a vida passa/e a sombra da fumaça/me faz adormecer...

Francisco Camargo é jornalista

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