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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Estamos na moda. Não me refiro ao Michel Teló [oh, my God...], mas às últimas notícias sobre a economia brasileira. Deus salve a rainha! "Emergimos", proclamou dia desses o publicitário Nizan Guanaes às margens do Ipiranga, profetizando que daqui pra frente tudo vai ser diferente. Em vez do país do cambalacho, seremos reconhecidos pelo brazilian way of life. Descobrirão que falamos português – e não espanhol. Que não cumprimos expediente na praia, secando potes de caipirinha em companhia de macacos e de gurias de topless. Que nossa capital não é Buenos Aires. Que a Amazônia nos pertence. Que pagamos pelas frutas que comemos. Que neva em São Joaquim.

Esperamos uma eternidade por esse momento. Mas senti calafrios ao pensar no que os marqueteiros mais pró-ativos podem fazer para nos transformar de Brasil em Brazil, resvalando na propaganda enganosa. O defeito vira qualidade. Sabemos bem como funciona noutros países.

Lembro das aulas de francês: "Les françaises sont très polis", ensinava a professora – com s’il vous plaît daqui e merci beaucoup dali. Me sentia o próprio Jeca no vernissage. Até lavar a alma com aquela cena debochada de Paris, eu te amo, em que uma francesa para tudo e dá informações detalhadas a uma americana simplória.

"Só em filme", como se diz. Polida é a minha mãe. Ainda estou chocado com a cena real de um turista brasileiro levando catiripapos do garçom no Moulin Rouge, minutos antes de um show, ora veja, de garotas de topless recém-chegadas de uma quitinete do Pigalle.

Os americanos, idem, saem bem na fotografia. A expressão "um americano em Paris" ficou simpática, mas salvo engano se refere ao ignorante convicto, aquele tipo que decide reproduzir no seu rancho do Texas as fontes da Place de la Concorde. Outro exemplo de "cosmetologia dos costumes" é a propalada espontaneidade dos italianos. Não foi bem essa a minha impressão ao ser tratado aos berros numa estação de Roma, como se fosse um rato de trem.

Não me tomem por ressentido. Entendo que não há bons modos que resistam passar a vida inteira explicando "onde fica a Torre Eiffel". Em minha defesa, lembro que o governo da França faz campanhas para que visitantes sejam bem tratados. E que certa ignorância americana foi devassada por intelectuais como Susan Sontag e Norman Mailer, para citar dois papas.

O que interessa é saber que diacho será esse brazilian way. Mentirinha? Dá para chutar. Há de se lembrar mundo afora que esse é o país do Pelé, café [café?], Carmen Miranda e blá-blá-blá [leia-se Gisele Bündchen e Kaká]. E que brasileiros são emotivos e generosos. "Uns queridos...". Como "querido" é qualidade de tribo perdida da Nigéria, vão nos pintar também como agressivos empreendedores trajando Armani. "Brasileiros amam carros e velocidade"; "brasileiras são poderosas e não dispensam um silicone – francês de preferência"; "brasileiros adoram boa música e fazem longas baladas depois do trabalho".

"Ih, não vai dar certo", como dizia o filósofo Hardy. Seremos descobertos. O europeu que passar por aqui e entrar numa loja em pés de chinelo terá a chance de ser mal atendido pela vendedora. Nossa cordialidade, óbvio, não inclui a faixa de pedestres, como de resto o motorista de ônibus. O mesmo se diga do apreço brazuca pela fina estampa – há um pré-sal inteiro entre o gasto com cabelos, celulares e peitos e os investimentos em cultura. Desculpe, bravos, mas dá para notar. Dia desses, um editor estrangeiro falou que a bunda é a maior contribuição brasileira à humanidade. Quase cantei o hino, mas entendo que podemos superar essa marca, não precisamente fazendo leg-press. Já são horas.

O matemático Antanas Mo­­ckus, um dos reformadores da Colômbia, diz que uma boa estratégia para mudar um país é perguntar à população as dez coisas que mais ama naquele lugar. Com as respostas, monta-se um programa a partir do que é bom. O mal escorre pelo ralo. Já ouviu falar da gentileza colombiana? Pois é verdade, logo não decepciona.

Acho que deveríamos seguir a receita. Que digamos nós "o que é o melhor do Brasil". Por certo, um lugar onde o povo nem sempre é polido. Onde se grita menos que na Itália. Onde também se sofre da "síndrome de americano em Paris". Somos muito iguais a todos, mas ficamos melhor se vistos de perto. Experimentem.

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