| Foto: Foto: Daniel Derevecki / Arte: Felipe Lima

O gráfico catarinense Ro­­berto Medeiros, 51 anos, bem merecia uma co­­menda do Vaticano – a de "assessor extraordinário para assuntos de Santo Expedito", mártir do cristianismo primitivo a cuja memória se dedica faz 12 anos, sem trégua e com a piedade de um cruzado em terras infiéis.

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Tudo começou com uma promessa da mulher de Medeiros, feita num desses momentos em que só resta apelar às instâncias superiores. A graça foi alcançada com a velocidade de um Sedex 10. Mas por ironia coincidiu com o infortúnio do comércio de carimbos e panfletos a granel, ganha-pão da família.

Roberto meditou: em vez de importunar o santo com mais uma ladainha, mal não faria se aproveitasse a deixa para imprimir, ao deus-dará, filipetas 6 x 10 cm com a figura do tal Ex­­pedito – um impávido guarda romano em sumários trajes de capa-e-saiote.

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Um consultor de moda não aconselharia o investimento, mas o operário se coçou e foi ao Paraíso. Em 2006, a Gráfica Me­­dei­­ros bateu a marca de 10 mi­­lhões de santinhos vendidos, feito comemorado com placa na fachada da loja, uma sala de 40 metros quadrados na Rua José Loureiro.

De lá para cá, o desempenho triplicou, mostrando que a devoção desafia as cinzentas teses do secularismo moderno. Hoje, Roberto vende 400 mil Expe­­di­­ti­­nhos por mês, a R$ 30 o milheiro, seguido no pódio pela popularíssima Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e por dois representantes do concorrido departamento das causas impossíveis – Santa Rita de Cássia e São Judas Tadeu.

A tomar pela contabilidade de Medeiros, haveria hoje 15 Ex­­pe­­di­­tinhos per capita apenas em Curi­­tiba, desempenho que bem merecia figurar no Guinness Book. E não há indícios de que vá ser ultrapassado por alguma devoção emergente, a exemplo da Medalha Milagrosa ou de São Sebastião, a quem muitos devem estar rezando para que Marcelo Dourado seja eliminado do BBB10.

O segredo da popularidade imbatível de Expedito – cujo nome significa rápido, ligeirinho, zastrás – é só um: o santo não opera no atacado, mas no varejo. Nunca deixa para amanhã o que pode fazer hoje. Assim na Terra como no Céu, esse é o tipo ideal, no amor, no trabalho e na fé. Daí haver tão pouca gente disposta a trocá-lo por cultos mais românticos – como a de Santa Teresinha do Menino Jesus –, cuja logística exige tempo e a sorte de receber rosas.

Mesmo assim, a incompreensão ronda o serviço expresso de Roberto. Não raro, religiosos de outras crenças se postam na porta da loja e lhe soltam os cachorros, acusando-o de propagar a idolatria às imagens. Ele não só não se abala como responde distribuindo Expeditos avulsos aos que não podem pagar por um lote. "Eu doo, mas tem loja de freira que cobra 16 centavos a unidade", alfineta.

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Ajudado pela atendente Car­­la Pacheco, 21, Medeiros também doa conselhos. Seu balcão é o Muro das La­­men­­ta­­ções. "Aqui tem santinhos para todos os problemas. Se a pessoa sofre de câncer, indico São Peregrino. Já ouvi cada história...", conta a garota. Quan­­do não sabe a especialidade do santo, Carla recorre ao Google. Foi assim que entre um pedido e outro o catálogo chegou a 70 ce­­lebridades da hagiografia católica – 72 contando Maria Bue­­no, a santinha municipal, e o folclórico São Longuinho, muito procurados pelo freguês.

Vale dizer que, mais do que um case de sucesso, o que une Roberto e Expedito não é a matéria. Assim como seu protetor, o gráfico serviu o Exército. Depois de dar baixa, passou por provações, dando duro nas tipografias do Centro. Não foi decapitado como o santo, mas ao comprar sua própria gráfica, com um prêmio de loteria, sentiu no pescoço a mão pesada da economia brazuca. É ou não é um martírio?

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