Deve ser um sinal dos tempos, uma daquelas excrescências que vingam em determinadas épocas porque o comportamento vigente permite. É, acima de tudo, uma desculpa furada e arrogante: "Me desculpe, mas eu sou assim mesmo...". Você já deve ter ouvido alguém colocando essa frase no meio da conversa, geralmente uma conversa desagradável. Falo o que penso sem me preocupar com os sentimentos do outro? Insisto em um assunto em momento inadequado? Faço piadas ofensivas? "Me desculpe, mas eu sou assim mesmo."
Quem diz isso está se justificando por permitir que sua natureza se manifeste de maneira bruta e impulsiva mesmo que incomode outras pessoas. Como se o ser humano não fosse a combinação de espontaneidade e contenção imposta pelo convívio social. Isto é civilização: contenção, submissão às regras de convívio social, enquadramento em uma história coletiva que determina em grande parte seu comportamento. Tem seu lado bom e seu lado ruim. Mas imagino que seja assim desde que as pessoas dentro da caverna se tornaram numerosas e as brigas ameaçaram a sobrevivência do grupo. Ou todos aprendiam a se controlar ou não ia sobrar ninguém para dar continuidade àquela história que estava sendo rabiscada nas paredes de pedra.
Um pouco de contenção não faz mal a ninguém e faz bem a muita gente que está em volta. Mas quem não quer se dar ao trabalho de fechar a boca e dominar a língua afiada (ou simplesmente chata) dispara a desculpa do "eu sou assim mesmo". Dia desses acompanhei um culto religioso em memória de um amigo falecido. O celebrante usou toda a duração de seu sermão para se queixar de um problema urbano que afetava o templo. Nem uma palavra sobre o reino dos céus, nem um consolo para a família e os amigos. Mas ele se justificou, claro! Justificou-se dizendo: "Me desculpem falar disso, mas eu sou mesmo assim." Ah, tá. Ele desabafa suas broncas para uma plateia enorme, frustra a expectativa geral (que era de outro tipo de discurso) e nós temos de aceitar a desculpa furada?
O que nós somos pode explicar os erros que cometemos, mas não justificá-los. Sou impulsivo, apressado, cáustico? Ok, todos temos características que podem ser desagradáveis conforme a situação. Mas que tal aprender a se controlar um pouco? Ser chato e desagradável não é pecado, mas bem que merecia ser.