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O ridículo de uma guerra inventada por alguns homens pode ser facilmente exposto pela história de um pulôver pego por um soldado e devolvido 30 anos depois à família do "inimigo".

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O rapaz de 19 anos é convocado para lutar na guerra. O governo precisa de soldados e convoca jovens mal preparados. Também estão mal equipados. Este nosso personagem só teve uma aula de tiro e sua barraca não resistiu à primeira tempestade. Não lhe equiparam com alimentos ou roupas suficientes. As batalhas ocorrem em uma região muito gelada, mas ele não tem abrigos adequados para as baixas temperaturas.

Uma noite ele sai com o sargento para localizar uma base inimiga. Entra em uma granja abandonada e aproveita para comer tudo que acha. Encontra um agasalho de lã. Veste o pulôver e não tira mais. Está aquecido pela primeira vez em semanas.

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Quando volta para casa, a família o saúda. Querem saber se ele matou alguém, se ficou frente a frente com o inimigo. É uma festa para recebê-lo e todos querem fazer perguntas. Aquele primeiro contato com os que não lutaram na guerra fez o rapaz perceber que sua experiência o distanciava dos outros. Disse para si mesmo:

– Ninguém entende o que você passou. Terá que ser forte: vai ficar sozinho com tuas lembranças para o resto de sua vida.

Provavelmente todos que lutaram em uma guerra sentiram essa solidão. No caso deste nosso personagem, houve uma reviravolta no cenário de isolamento que ele previu para si mesmo.

Ele é um argentino que lutou nas Malvinas, na guerra de 1982. Seu nome, Miguel Savage. Sua história está contada em um site (http://www.viajemalvinas.com.ar). Eu não quis contar antes de quem se tratava porque até aqui a história do argentino se parece com a história de tantos outros homens que lutaram em tantas outras guerras. Eu não poderia estar falando de um europeu na Primeira Guerra? Ou de um pracinha brasileiro na Itália, na Segunda Guerra? Ou de um afegão que lutou contra os russos ou contra os americanos?

Voltemos a Miguel, o argentino. Anos mais tarde ele quis rever as Malvinas levando a esposa e o filho. Faltou dinheiro e um amigo se ofereceu para bancar as despesas. O amigo se chama James e nasceu nas Malvinas, em uma família inglesa. O pai de James, Terry, é um veterano da guerra, como Miguel. Os dois veteranos são apresentados um ao outro em meio aos destroços envelhecidos daquela guerra de 30 anos atrás e compartilham suas experiências. Os dois se entendem – diante da experiência compartilhada, o fato de terem lutado de lado opostos, e, portanto, serem "inimigos", não significa nada. Cada movimento, cada manobra que podem lembrar é comentada um com o outro e eles descobrem que se cruzaram de forma muito perigosa.

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Foi assim: uma noite, o grupo de Terry avançava na área ocupada pelos argentinos. Escondidos, viram quando um grupo de seis soldados atravessava um rio. Estavam expostos e seria fácil matá-los, como um dos soldados sugeriu. Mas o chefe do regimento achou melhor deixá-los ir para não alertar os argentinos e manter o fator surpresa no ataque do dia seguinte. Miguel era um dos seis soldados. Escapou de morrer ali, naquele rio gelado das Malvinas, que ele invadia para a Argentina ou das Falklands, que Terry defendia para a Inglaterra.

Seis anos depois, Miguel voltou à ilha uma segunda vez. Desta vez levou o pulôver, que entregou na fazenda de onde o havia tirado 14 anos antes. Entregou junto uma carta, em que se explicava ("fazia - 20°C e eu estava molhado"). O dono do pulôver já tinha morrido e quem o recebeu foi a filha dele.

As idas e vindas de Miguel às ilhas fazem parte de um processo de apaziguamento que ele buscou para si. Não quis guardar aquela experiência que parecia sem sentido e patética. Ainda por cima, perdedora. Por isso foi atrás das lembranças e até do inimigo. É uma bela história, mas também é incômoda, desconfortável. Me dá raiva a constatação de que o ridículo de uma guerra inventada por alguns homens pode ser tão facilmente exposto pela história de um pulôver. Quando o soldado argentino e o soldado inglês se encontram, sabem bem que são apenas duas vítimas. Nem heróis são. Nem se sentem como inimigos. Então, para que aquela loucura de 30 anos atrás? No caso de Miguel, ele lutou em uma guerra inventada pelos generais que precisavam de justificativa para não deixar o poder. No caso de Terry, foi uma guerra por uma terra que o governo de seu país, resolveu ocupar no século 19, ainda que fosse muita longe da outra ilha, a Inglaterra.

As guerras, todas elas, ocorrem porque falhou a capacidade de conversação, porque uns poucos impuseram seus interesses passageiros ou seu orgulho ferido.

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