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Ele aprendeu da pior maneira que é melhor não saber os segredos dos outros. Foi assim: o melhor amigo andava tendo momentos de melancolia. Lá estavam os dois, vendo o futebol na tevê, quando ele notava que Pedro emudecia, às vezes até abaixava os olhos para o chão e parava de olhar para a tela. Quando ele perguntava o motivo, o rapaz saía pela tangente com um "nada não, é estresse". Ou "estou meio resfriado".

Um dia, Pedro comentou que estava indo a um terapeuta havia algumas semanas, mas a conversa não avançava. Por quê? Porque ele não queria se abrir, falar sobre o segredo que o incomodava.

Mas analista não é para isso mesmo? Para contar tudo, sem censura, para falar dos podres escondidinhos lá no cantinho da alma? É, mas Pedro tinha um segredo assustador e não queria incomodar ninguém com ele. Ninguém, viu?

Como assim? "Não dá para contar para seu melhor amigo, que já te viu em tantas situações esquisitas e mesmo assim continua ao teu lado? Já te vi bêbado, já te vi chorando ao ouvir Roberto Carlos, já te vi fazer barbeiragem no trânsito e continuo teu amigo."

Nada convenceu Pedro. O segredo iria perturbar o amigo e ele não queria isso. Queria poupá-lo.

Dias depois, Pedro desistiu do terapeuta. "Não vai pra frente mesmo por causa do segredo", justificou.

O segredo! Quase esquecido dele, o amigo voltou a se interessar pelo assunto. Especulava mentalmente sobre o que seria. Segredos geralmente envolvem sexo. Era uma possibilidade. Um crime, talvez – mas isso não combinava com Pedro. Apostava mais no sexo: qualquer um pode ter um segredinho dessa categoria guardado no armário. As especulações não evoluíam, mas a intenção de forçar Pedro a falar se tornou mais forte.

Começou a cercá-lo com cobranças. Foi usando todos os argumentos. Nada poderia assustá-lo. A amizade deles já tinha enfrentado desafios maiores. Ele era um túmulo, morreria sem revelar o segredo. Falar faria bem a Pedro.

Uma noite foram ao aniversário de um conhecido. Festa familiar, arrastada, sem atrativos. Sentados em um canto da sala, bebendo cerveja e comendo minicoxinhas, os dois conversavam para passar o tempo. Não era o momento propício para falar de assuntos sérios; tinha muita gente ao redor. Pois Pedro falou. Cabeça inclinada, olhar medroso, contou o segredo.

O amigo ficou mudo. Não porque tenha ficado chocado, apenas surpreso, e não achava o que dizer.

Foram embora logo. No caminho até os carros, Pedro quebrou o silêncio. "Te assustei, né?"

O amigo reagiu sorrindo e tocando o ombro de Pedro. "Obrigado pela confiança. Conta comigo."

Saiu mudo e arrependido, prevendo o que estava por vir. Seria tomado pela vontade de contar o segredo para alguém, não ia mais conseguir olhar para Pedro sem pensar naquilo. Besta que foi de pegar no pé do outro até arrancar aquela história que não lhe dizia respeito. Talvez a solução fosse procurar um terapeuta – uma solução cara, é verdade. Mas com ele poderia falar, contar tudo. Até o segredo do Pedro.

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