Dá para imaginar a cena: o cidadão mora em uma casa velhinha, simpática que só, pertencente à família desde, pelo menos, a fronteira histórico-mitológica do tempo dos bisavós. O lugar é bacana – tem chapa de assar polenta e sapecar pinhão, caixão de lenha, lambrequins, sótão, janelas guilhotina e até lâmina de raspar sola de bota ao lado da porta de entrada –, mas, como costuma acontecer na alta modernidade, não dá conta das demandas existenciais. A casa, em síntese, carece de mais um cômodo para abrigar a almofada de meditação, a coleção de carrinhos de matchbox ou a máquina de fliperama resgatada a preço de ouro de um boteco em Colombo e que há séculos está tomando pó no fundo da garagem.
Decidido, o morador inicia a ampliação do imóvel por conta própria, amparado no fato de que, em alguns dias, os operários contratados hão de apagar os traços de quaisquer incursões desastradas pelo mundo da construção civil. Desde que não acerte um cano, está valendo.
Ele desce ao porão, escolhe o lugar, afasta as tranqueiras e detona o já meio carcomido assoalho de madeira. Picareta, pá e buraco. E, no fim do buraco, surge o mistério de um buraco maior ainda, boca de alguma coisa que não deveria estar ali. Outra sala, secreta desde, pelo menos, o tempo necessário para o esquecimento.
Assustado, ele volta para a luz do dia e chama a mulher, que pega uma lanterna e avança pelo buraco com aquela energia que só tem quem quer desmoralizar o cônjuge. E a sala descoberta não é uma sala, mas um túnel que leva a uma enormidade de outros cômodos, corredores, escadarias, depósitos, cisternas e praças subterrâneas.
Um mistério bacana, desses que fazem pensar na enormidade de coisas que ainda há para descobrir
Mistério dos mistérios. No fim das contas, os bisavós haviam esquecido de revelar o detalhe abrasador de que a casa ficava em cima de uma cidade secreta. Coisa pouca, menos para os arqueólogos e para os amantes da literatura fantástica, que teriam aí um bom (ainda que meio manjado) início de livro.
Pois a história, salvo pelas licenças à curitibanidade, é verdadeira. A cidade subterrânea, Derinkuyu, foi encontrada em 1963 na Capadócia por um cidadão que reformava a própria casa. E por lá há outras noventa e nove, construídas entre o neolítico e o final do século VIII por motivos que encontram justificativa no medo pânico de invasores. Para onde foram os moradores, porém, ninguém sabe, e nem porque elas acabaram esquecidas.
Em síntese: um mistério bacana, desses que aquecem o coração e fazem pensar na enormidade de coisas que ainda há para descobrir. Em caso de tédio, picareta na mão!
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