Conheço muitos apaixonados por notícias esdrúxulas. Eu mesmo me amarro em histórias sobre Jesus visto em torradas, fantasmas ou ornitorrincos fosforescentes criados por engenharia genética. Um fenômeno cultural que poderia ser explicado por aquele salutar desejo pelo maravilhoso que mora até mesmo nos espíritos mais racionais. Romantismo essencial: tomar conhecimento desses fatos nos devolve ao necessário campo dos mistérios e permite, inclusive, vivenciar a experiência do estrangeiro.
Na semana que passou, por exemplo, li uma reportagem sobre a publicação, pelo Ministério da Educação do Japão, de um decreto estabelecendo regras para as pirâmides humanas (em japonês, kumitaisô), prática tradicional das escolas do país. A ideia seria limitar as configurações a cinco linhas de estudantes agachados e montados uns sobre os outros, uma altura máxima de cinco metros. Com isso, a perspectiva é reduzir o número de acidentes causados pela eventual ruptura das pirâmides. No ano passado, por exemplo, seis estudantes de uma escola de Osaka ficaram feridos depois que uma estrutura de dez linhas (três andares) desabou. Ossos quebrados, carne rasgada e nervos torcidos – e indenizações pedidas às escolas.
Por que construir pirâmides de estudantes?
Eu mesmo, aliás, testemunhei acidente parecido quando, há décadas, fiz parte de um grupo “piramidal” de estudantes do Cefet-PR durante uma aula de natação: a gurizada resolveu construir a estrutura por conta própria dentro da piscina e, quando a obra estava com uns seis andares, a base começou a andar, arremessando o estudante do topo metros longe da água. Ele ficou lanhado e a turma ganhou uma advertência.
Resta, então, a misteriosa questão: por que construir pirâmides de estudantes? No nosso caso paroquial, a resposta reside no espírito de imbecilidade que, vez por outra, assume o controle de grupos de adolescentes do sexo masculino. No caso do Japão, a explicação é outra. Lá, as pirâmides patrocinadas pela direção das escolas materializam o poder coletivo, algo próprio de uma civilização de base confucionista. Estruturas gigantes, então, simbolizariam o sucesso do compromisso dos indivíduos com seu próprio grupo. Os indivíduos, porém, também falham, especialmente quando submetidos à pressão excessiva de seus pares.
No fim das contas, a notícia não é tão estranha assim, desde que assumida no contexto filosófico. No Japão, estranho é uma escola sem pirâmides humanas. Entre nós, abstraindo egípcios e maias, pirâmide é sinônimo de traquinagem juvenil ou de esquema financeiro fraudulento – o que deve soar bem estranho para ouvidos nipônicos.