Acusado de vender informações sigilosas, o site Cartório Virtual tornou-se alvo de investigação do Ministério Público de São Paulo. Em meio à polêmica envolvendo a privacidade na internet, o endereço eletrônico oferece não só dados de documentos pessoais, mas também a localização de bens, contas detalhadas de telefone e até conversas no WhatsApp.
Site ‘Tudo Sobre Todos’ divulga até o nome de vizinhos
Hospedado no exterior, o site Tudo Sobre Todos é outro domínio que tem causado polêmica no Brasil. Por meio de consultas informando apenas o nome completo, o site oferece informações como CPF, endereço aproximado e até quem são os vizinhos da pessoa. A facilidade em obter dados sigilosos motivou petições contrárias ao site.
Algumas buscas são feitas gratuitamente. Para outras informações é preciso comprar créditos, com planos que custam de R$ 9,90 a R$ 79. Os organizadores do Tudo Sobre Todos dizem coletar só informações de acesso público. “Apenas simplificamos o processo de busca, não geramos nem exibimos dados sensíveis, como raça ou sexualidade. Já existem várias fontes que efetuam o mesmo serviço ou um serviço similar”, afirmam. Na visão do site, se as informações podem ser obtidas na internet, não são sigilosas. Ainda de acordo com a página, o objetivo é promover o encontro de pessoas que perderam contato há muito tempo. Para Bruno Miragem, presidente do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor, as informações disponíveis podem ser perigosas. “Pode provocar o uso indevido para fraude ou, dependendo da natureza dos dados, colocar a segurança pessoal em risco.” Nem a Polícia Federal nem o Ministério da Justiça afirmam ter solicitado a suspensão do site. O Tudo Sobre Todos diz não estar localizado no Brasil por causa da burocracia para abrir um domínio.
“Se você tem dúvidas? E deseja saber para quem seus parentes ou funcionários estão telefonando! Temos uma solução jurídica: conta detalhada ligações (sic)”, afirma um anúncio publicado no Cartório Virtual, que diz revelar todos os registros de ligações efetuadas, duração e data da chamada, além do número de destino. O valor cobrado não é informado no site.
A busca de imóveis por nome ou CPF custa R$ 298, e o detalhamento de mensagens no WhatsApp sai por R$ 4 mil, conforme documento apreendido na investigação do MP. Diversos outros serviços são oferecidos, como consulta completa de CPF, além da autoria de sites e de endereços de e-mail. Na página, o Cartório Virtual afirma ter “dez anos de excelência em prestação de serviços jurídicos”.
Para o promotor criminal Cassio Roberto Conserino, responsável pela investigação, o site comercializa dados confidenciais dos cidadãos e viola o direito à intimidade e à vida privada. Entre os principais problemas apontados na investigação está a bilhetagem (as “contas detalhadas” de telefone), cujo vazamento é considerado crime e só deveria ser obtida por autorização judicial. “Isso favorece a arapongagem, extorsão e uma série de problemas à margem da legalidade”, justifica. “Evidentemente, tais informações não são obtidas dentro da legalidade”, diz, na investigação.
Após reunir indícios, o promotor solicitou à Justiça a suspensão do site. O pedido, contudo, foi indeferido sob argumento de não haver nos autos documento que comprove a prática de bilhetagem. O juiz considerou a obtenção de dados como CPF de “domínio público”.
Ao recorrer, Conserino solicitou um mandado de busca e apreensão no endereço relacionado a Marcelo Lages Ribeiro de Carvalho, apontado como responsável pelo Cartório Virtual, além de autorização para comprar o serviço de bilhetagem.
Por telefone, Carvalho afirmou à reportagem que desconhece a investigação. Ele diz que atua como tabelião e perito judicial e auxilia em investigações que envolvem conflitos, cíveis ou criminais. Os casos, diz, vão de ameaças de morte a perturbação de sossego.
De acordo com Carvalho, seu site já prestou serviço para órgãos policiais e Tribunais de Justiça no País inteiro. “Já emiti cerca de 20 mil laudos”, diz. “Se eu não tiver 100% de certeza da informação, não divulgo.”
Carvalho não considera que cometa irregularidades e diz estar respaldado nos Códigos Civil e Penal, entre outras leis específicas.
Apesar de não confirmar se recebe autorização da Justiça para quebrar algum sigilo, diz atuar sempre dentro da “legalidade”. “Tenho acesso aos cartões de crédito, se fosse de má-fé, já estaria milionário.”
Questionado se o serviço do site não configura invasão de privacidade, Carvalho respondeu: “Seria se fosse uma pessoa comum, e não um perito. É o mesmo exemplo dos bombeiros: se está pegando fogo em uma residência, ele não tem de quebrar uma porta? Ele faz o que é necessário para salvar vidas.” “O que eu tenho para passar, passo. Se tiver de entrar num banco de dados para pegar uma informação, eu entro, levo à Justiça e emito o laudo.”
O perito também não informa quais bancos de dados acessa para conseguir as informações. “Como jornalista, você não é obrigado a informar a fonte. Eu também não”, disse.
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