Ponta Grossa Um novo tormento ronda os parentes das vítimas do acidente com o Airbus da TAM: a possibilidade da não-identificação dos corpos, impedindo que as vítimas sejam enterradas e que as famílias tenham um local para chorar seus entes.
O Instituto Médico-Legal (IML) de São Paulo já admitiu que alguns corpos podem não ser reconhecidos porque as temperaturas muito altas no local danificaram a estrutura genética de algumas pessoas. Pior são os entraves burocráticos. Para quem estava no prédio ou nas imediações do aeroporto, ainda será necessário provar que a pessoa não identificada pelo IML estava realmente no local e no horário.
É o caso de Gustavo Pereira Rodrigues, 23 anos. Ele não era funcionário da TAM, mas trabalhava no prédio atingido como consultor de uma multinacional norte-americana. Dois dias depois do acidente, a companhia aérea incluiu o rapaz na lista de vítimas, reconhecendo que ele poderia estar na TAM Express. "É muito mais fácil comprovar a situação de quem estava no vôo do que de pessoas em solo, eventualmente atingidas na queda", explica o advogado Leonardo Amarante, especialista em responsabilidade civil. Ele defende 55 famílias de passageiros do vôo 1907, da Gol, que caiu em setembro.
Quando há indícios fortes da presença em um desastre, a Justiça pode conceder o atestado de morte presumida. Para o advogado, é importante que as famílias cobrem que todos os processos possíveis de identificação sejam aplicados pelo IML, resultando no atestado de óbito, que serve não apenas para ações de indenização, mas também para requisição de seguros e pensão por morte.
Aliança
A aliança de noivado que trazia o nome "Karine" gravado era o único objeto pessoal que poderia identificar Rodrigues, que não tinha cicatrizes, tatuagens ou outras marcas pelo corpo. O pai e o irmão dele vasculharam vários sacos no IML e nada encontraram. Não se sabe nem se o corpo foi encontrado nos escombros. Resta agora aguardar a identificação por DNA.
Os parentes de Gustavo retornaram no domingo para Carambeí, nos Campos Gerais. "Não há mais o que fazer lá e eu não consegui ficar no apartamento onde a gente morava", conta a noiva Karine Andréa Carneiro, 21 anos. Eles estão em permanente contato com a TAM e com a companhia onde Gustavo trabalhava, mas não têm informações sobre o rapaz. Ela agora confia na identificação do corpo. A família não procurou qualquer medida judicial porque avalia que não será necessário recorrer a um atestado de morte presumida. "A TAM comunicou que o tratamento será igual ao dado aos passageiros", disse. Karine agora se dedica a preparar uma missa em homenagem ao noivo.
"Dependendo do tempo em que o corpo ficou exposto a (altas) temperaturas, é possível que haja degeneração completa do DNA. Então, em casos excepcionais, pode acontecer de não termos a identificação'', afirmou o médico legista da Polícia Civil do Distrito Federal, Matheus Fonseca Galvão. No caso do acidente da TAM, Matheus Galvão disse que a maioria dos corpos deverá ser identificada por exames genéticos.
"A gente tem que entender realmente a angústia, a apreensão das famílias, mas podemos observar que o trabalho está sendo feito com muito afinco, com muito entusiasmo pela equipe de São Paulo'', diz
Entre as 66 vítimas identificadas até a noite de ontem estavam três paranaenses. O engenheiro Heurico Tomita foi sepultado em Maringá no sábado. O executivo Roberto Weiss Júnior era curitibano, mas foi levado para Porto Alegre onde morava e trabalhava. Ontem foi reconhecida Zenilda Santos, natural de Peabiru, mas residia em Natal, no Rio Grande do Norte. Ela, o marido e os dois filhos morreram no acidente.