Não está na hora, pergunta uma leitora, de os professores de Português das escolas públicas ensinarem aos alunos "apenas" gêneros mais comuns à realidade deles? Dois exemplos: preencher currículos e se comportar bem em uma entrevista de emprego.
Esse conhecimento mais pontual pode ser oferecido em cursos específicos, de semanas ou meses, mais voltados ao mercado de trabalho. Obviamente, as escolas públicas não precisam ignorar tais conteúdos, desde que não se comportem como sucursais do mercado.
Um dos problemas, como tentei deixar claro antes de pedir para comentar o assunto nesta coluna, é que, se tomada como referência de trabalho em sala de aula, essa proposta pode se transformar em um desastre. Mais que isso, em um crime contra os estudantes.
Embora admita exceções, a regra é esta: alunos da rede pública pertencem às classes mais empobrecidas da sociedade. Filhos de cortadores de cana, por exemplo, estudam em escolas públicas assim como filhos de porteiros, domésticas, borracheiros, garis. Mas também de professores, incluindo, é claro, os de Português.
Que gêneros devem ser trabalhados em um solo tão plural? Qual é a realidade desses estudantes? Quais são seus sonhos? Seguir a carreia dos pais? O que devemos ensinar aos filhos da chamada classe C?
Nenhuma instituição é mais democrática que a escola e nenhuma está mais capacitada para expandir essa noção, quase sempre determinista, de "realidade". Nela, os alunos podem entrar em contato com os saberes especializados das diversas áreas do conhecimento. A escola amplia o horizonte dos estudantes, e isso possibilita escolhas, novos rumos.
Nada de errado o filho seguir a carreira do pai. Errado seria o professor de Português cair na besteira de não apresentar Drummond e Pessoa a seus alunos. Dois poetas sem importância para o mercado de trabalho.
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