Defensores públicos do estado estão redigindo o texto de um habeas corpus coletivo para impedir a prisão de usuários. A ação é mais uma ofensiva a favor da descriminalização das drogas. A medida, no entanto, sequer tem previsão para entrar em vigor. Assim que for concluído, o habeas corpus será impetrado no Juizado Especial Criminal e será apreciado pela Justiça. Para o defensor público Rodrigo Pacheco, a medida impedirá que muitas injustiças sejam cometidas, já que a lei é não define qual a quantidade de droga caracteriza uso ou tráfico. Com o habeas corpus, o usuário pego com qualquer tipo de droga não poderá sequer ser levado para a delegacia.
“A ideia de fazer o habeas corpus foi baseada na inconstitucionalidade da criminalização do uso de drogas. A lei é vaga e dá margem para que muitas injustiças sejam cometidas. O usuário flagrado pela polícia é levado para a delegacia e depende exclusivamente da avaliação do policial para caracterizar se é uso ou tráfico. Ele assina um termo circunstanciado e o caso é encaminhado do Juizado Especial Criminal (Jecrim), onde poderá ser punido com pagamento de multa ou prestar serviços comunitários. O habeas corpus impede isso”, explicou o defensor.
O habeas corpus coletivo não especifica a quantidade nem o tipo de droga e impede a prisão de qualquer um que esteja portando maconha, cocaína, crack ou drogas sintéticas. Rodrigo Pacheco disse que, na semana passada, já houve outra ação. A Defensoria Pública do Estado já tinha lançado outra ofensiva. Passou a orientar os 762 defensores em exercício a pedir automaticamente a inconstitucionalidade de toda prisão de usuários de drogas no estado. Sem esperar pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que apreciará o assunto, o órgão tenta revogar na prática a criminalização do consumo, por entender que é questão de foro íntimo do usuário — a prisão, no caso, seria invasão de privacidade.
Pesquisadora aprova a ideia
Para a pesquisadora Ana Paula Pellegrino, do Instituto Igarapé — que dedica-se à integração das agendas de segurança e desenvolvimento —, esse tipo de ação é muito bem vinda.
“Temos que mudar o ponto de vista que existe sobre o usuário. É uma política falida considerar o usuário um criminoso. A humanidade usa drogas há séculos. Tem gente que usa e não tem problemas, outros desenvolvem uso abusivo. Para essas pessoas, a resposta deve ser o tratamento, não a criminalização. Não levar preso o usuário é um caminho, sim. O habeas corpus vai enriquecer o debate sobre a descriminalização do uso”, diz.
O STF deve votar ainda este ano a ação que descriminaliza o uso de droga no país. O ministro Gilmar Mendes é o relator de um processo e deve incluir ainda a proposta de que um juiz analise se uma pessoa apanhada com drogas é usuária ou traficante.
A inspiração para a elaboração do habeas corpus coletivo, segundo Rodrigo Pacheco, surgiu depois de uma ação semelhante adotada em Volta Redonda. Lá, há cerca de quatro anos, os flanelinhas eram presos e levados para a delegacia por exercício ilegal da profissão. A Defensoria Pública impetrou um habeas corpus coletivo para impedir a prisão e já está sendo analisado em última instância, depois de recursos, e agora depende do Supremo Tribunal Federal (STF).
Trabalhando há mais de 30 anos com dependentes químicos, sendo 25 deles no Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas (Nepad) da Uerj, a psiquiatra Maria Theresa de Aquino, disse ser a favor da medida proposta pela Defensoria Pública do Estado, apesar de ser contra a liberação da drogas.
“Não é crime portar droga. É doença o que a pessoa carrega consigo. Aplaudo esse tipo de atitude, porque o usuário não é um meliante. O usuário de drogas não é um caso de polícia. É um caso de saúde pública”, disse Maria Theresa. “No entanto, sou contra a liberação e legalização das drogas. Acho que o Brasil ainda não está preparado para isso e ainda não me apresentaram nenhum argumento sólido sobre isso. Já existem drogas demais no mercado”, completa.
Já o juiz Fábio Uchôa, da 1ª Vara Criminal da Capital, é contra a medida da Defensoria Pública. Segundo ele, a lei especifica o que é tráfico e uso. O magistrado afirma que lei não incrimina o uso da droga e, prova disso, é que não há nenhum usuário preso. Para ele, o habeas corpus coletivo proposto pela Defensoria Pública libera o uso de todas as drogas, o que vai aumentar ainda mais o tráfico.
“Acho que o Brasil não está preparado para a descriminalização, porque há um submundo na comercialização”, avaliou o magistrado. “Mesmo os países que liberaram a maconha, não liberaram as outras drogas”.
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