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Soterrados

Dia de dor e medo em Niterói

O Morro do Bumba, em Niterói, depois do deslizamento da noite de quarta-feira: após abrigar lixão durante 16 anos, local não deveria ter moradias | Sérgio Moraes/Reuters
O Morro do Bumba, em Niterói, depois do deslizamento da noite de quarta-feira: após abrigar lixão durante 16 anos, local não deveria ter moradias (Foto: Sérgio Moraes/Reuters)

Rio de Janeiro - A tristeza e o desespero se abateram ontem sobre Niterói, a cidade com o maior número de mortos em decorrência das chuvas desde segunda-feira no estado do Rio de Janeiro. Com o deslizamento no Morro do Bumba, por volta das 21 horas de quarta-feira, chegou a 104 o número de mortos no município, o que levou o prefeito Jorge Roberto Silveira a decretar estado de calamidade pública. A prefeitura estima que pelo menos 200 pessoas tenham sido soterradas no local e que 50 casas foram destruídas. Até a noite de ontem, 14 corpos foram recolhidos. Em todo o estado, o número de mortos chegou a 179.

Para piorar a situação, um boato de arrastão levou pânico à população de Niterói ontem. O comércio do centro da cidade, os bancos e o Fórum fecharam as portas e houve correria em ruas centrais. Segundo policiais, traficantes do Morro do Estado, a maior favela do município, teriam mandado fechar o comércio em protesto contra a falta de atenção com as vítimas das chuvas. No final da tarde, a Polícia Militar desmentiu a informação e afirmou que houve apenas um protesto no Morro do Estado.

Lixão

A tragédia no Morro do Bumba, uma área de ocupação irregular, foi anunciada horas antes da avalanche que varreu a comunidade. No fim da tarde de quarta-feira, um deslizamento soterrou uma casa e deixou um morador desaparecido. Bombeiros foram chamados. Eles deixaram o local por volta das 18h30. Não deu tempo: entre 20h30 e 21 horas ocorreu o deslizamento.

O local, no bairro Viçoso Jardim, abrigou um lixão entre 1970 e 1986. Com a desativação do lixão foi proibida a ocupação do local, na administração do prefeito Waldernir Bragança, mas aos poucos, por falta de fiscalização, foram construídas pequenas casas de alvenaria. Ao longo do tempo, o local ganhou uma grande caixa d’água, uma quadra poliesportiva e uma creche.

Para a secretária de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro, Marilene Ramos, a provável causa do deslizamento foi uma explosão do gás metano, decorrente da decomposição do antigo lixão. O lixo em decomposição teria formado uma bolsa de gás, que em contato com o ar teria causado a explosão ouvida pelos moradores antes do deslizamento. "Trata-se de um terreno insalubre. Ainda que não houvesse tamanha instabilidade, nunca deveria ter sido ocupado", disse. A cor preta do solo que deslizou é resultado da decomposição do lixo.

Outra causa pode ter sido o acúmulo de água no solo, já que o terreno de rocha em decomposição forma fraturas, por onde a água penetra e se acumula. Além disso, o lixo que se acumula forma um chorume, que desliza como lama. Em 2004, o Instituto de Geociência da Universidade Federal Flumi­nense fez um estudo sobre o Morro do Bumba, a pedido do Ministério das Cidades, e constatou que a área tinha alto risco de acidentes e exigia monitoramento constante. A Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente de Niterói abriu um inquérito para investigar se o deslizamento foi causado por falha humana.

Na terça-feira, cinco pessoas haviam morrido soterradas no local, após um deslizamento que destruiu duas casas. "Os moradores foram alertados de que precisavam sair do local’’, disse o secretário municipal do Meio Ambiente de Niterói, José Antônio Fer­nan­des. Moradores negam ter recebido o alerta. Naquele dia, a prefeitura iniciou a abertura de um canal para escoar a água. Os operários trabalharam até as 18 horas de quarta-feira, horas antes do deslizamento. Um vigia que tomava conta da retroescavadeira usada no serviço morreu soterrado.

O governador do Rio, Sérgio Cabral, estima que serão necessárias duas semanas para resgatar todos os corpos.

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