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Veja o que compunha o chamado kit contra a homofobia |
Veja o que compunha o chamado kit contra a homofobia| Foto:

Reação

"Um retrocesso", define associação

A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) divulgou nota considerando a suspensão do kit um "episódio infeliz" que configura "um retrocesso no combate a um problema – a discriminação e a violência homofóbica – que macula a imagem do Brasil internacionalmente no que tange ao respeito aos direitos humanos". De acordo com o texto, as 237 entidades afiliadas à associação receberam a notícia "com perplexidade, consternação e indignação".

Segundo a articuladora estadual da Liga Brasileira de Lésbicas (LBL), Léo Ribas, a separação entre as instituições governamentais e religiosas (estado laico), prevista na Constituição, foi desconsiderada nesse caso. "O fato de a presidente ceder a uma bancada fundamentalista mostra que a laicidade, que está no preâmbulo da Constituição, não está sendo respeitada", avalia.

A ABGLT lembrou ainda que um assassinato a cada dois dias no Brasil é motivado pela homofobia, segundo dados do Grupo Gay da Bahia. Para a associação, uma das maneiras de reduzir a violência homofóbica é por meio da educação.

O Ministério da Educação (MEC) não irá mais distribuir o chamado kit contra homofobia nas escolas públicas de ensino médio de todo o país. O cancelamento foi determinado ontem pela presidente Dilma Rousseff, após meses de polêmica envolvendo o conteúdo dos vídeos que compõem o kit. O material estava sendo elaborado por ONGs para servir de apoio aos professores, com dicas sobre como tratar o tema em sala de aula e combater a discriminação contra alunos gays.A presidente determinou que todo o material do governo que se referir a "costumes" terá de passar, a partir de agora, pelo crivo do Palácio do Planalto e por processo de consulta à sociedade. A decisão pela suspensão do kit ocorreu após uma reunião com representantes das bancadas evangélica e católica do Congresso e integrantes da frente parlamentar da família. Segundo o ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência, Dilma considerou o material do MEC "inadequado" e o vídeo "impróprio para seu objetivo". Os deputados que estiveram no Planalto acham que os vídeos e o kit são um "estímulo" à homossexualidade.

Para representantes de associações LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), a suspensão do kit mostra que o governo não tem uma postura clara e é frágil frente a pressões. "Dessa forma, a presidente desautoriza o seu próprio ministro [Fernando Haddad], que na semana passada reafirmou o compromisso com a distribuição do material", afirma Márcio Marins, diretor geral do grupo Dom da Terra, instituição que trabalha na defesa da cidadania LGBT e da cultura afrodescendente.

Na última quarta-feira, após encontro com parlamentares da bancada evangélica, Haddad negou que o MEC havia decidido alterar o conteúdo do kit de combate à discriminação contra homossexuais. Ele assegurou que os deputados poderiam manifestar sua opinião à comissão de publicação de materiais do ministério, mas que as sugestões poderiam ou não ser acatadas. Por esse motivo, a decisão da presidência surpreendeu os defensores do kit.

Marins classificou a suspensão como "golpe baixo" e disse que não esperava por essa reação do governo. "Isso é fazer barganha com a cidadania, a segurança e a educação de cidadãos e cidadãs que precisam ter assegurado o direito a uma educação livre de discriminação", disse.

Grande decepção

Segundo a professora Araci Asinelli da Luz, do programa de pós-graduação em Educação da Univer­sidade Federal do Paraná, o kit já havia recebido parecer favorável dos conselhos regionais de Medicina e Psicologia, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e do Programa das Nações Unidas para HIV e Aids (Unaids). "O que aconteceu foi uma grande decepção. As grandes referências sob o ponto de vista da educação avaliaram o material como coerente e adequado. Conteúdos técnicos deveriam ser definidos por técnicos e não por religiosos", afirma.

Contrário à distribuição do kit, o professor de filosofia Carlos Ramalhete critica a forma como o material foi produzido. "O que o governo tem feito é convocar simplesmente quem tem a mesma opinião e colocá-los para falar a respeito", afirma. Segundo ele, os defensores do kit estão tentando mudar a cultura do país "na canetada".

Na prática, a decisão do governo virou um verdadeiro "tiro no pé". Horas depois de proibir o material, os vídeos caíram na internet e foram acessados por milhares de internautas.

Pacote era voltado a alunos de ensino médio

O kit de combate à homofobia nas escolas nunca foi destinado a crianças, não incluía a distribuição de cartilhas e não seria de uso obrigatório das escolas, se­­gundo o Ministério da Edu­­cação (MEC). De acordo com a pasta, ele tinha como destino apenas as escolas de Ensino Médio que quisessem receber o material caso estivessem sofrendo situações de bullying entre seus alunos e alunas.

Além disso, afirma o MEC, os vídeos publicados na internet como parte do kit nunca haviam sido aprovados pelo grupo que estudava a produção do material. Os filmes em questão, produzidos pela ONG Pathfinder, eram alguns dos exemplos sob análise da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad) do MEC. A produção só teria início no segundo semestre deste ano, após a fase de análises. A ideia seria distribuir três vídeos de cinco minutos acompanhados de uma publicação de orientação para professores.

Diálogo

O diretor-geral do grupo Dom da Terra, Márcio Marins, defende que um debate sobre o material, com consultas mais amplas à sociedade, deve ser precedido por um processo de esclarecimento sobre a homofobia e o conteúdo do kit. "Não sei se é o melhor caminho no momento, até porque a população não tem conhecimento sobre os indicadores de violência contra a população LGBT no país. Consultar as bancadas pode até ser um processo interessante, desde que seja livre de qualquer tipo de influência religiosa", diz.

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