A tentativa de desmistificar trotes “pesados” praticados em diversas universidades do país acabou em clima descontraído e muitos sorrisos em um ambulatório de crianças com câncer de Curitiba. A ideia é de um grupo de veteranos do curso de Medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que decidiu antecipar o contato prático de seus calouros e levou os novos universitários para uma manhã de recreação com meninas e meninos que passam por tratamento no local.
A primeira ação foi nesta quarta-feira pela manhã (8). Mas como a turma precisou ser dividida, mais risadas e brincadeiras vão se repetir até o fim da semana. A ideia é acabar com os “joguinhos” de mau gosto na recepção dos novos alunos e mostrar aos que estão chegando que solidariedade “olho no olho” são exercícios imprescindíveis na construção de um bom profissional.
“O pessoal já fica com receio quando ouve a palavra trote, mas queremos desmistificar isso”, afirma Lucas Eduardo Venâncio de Matos, que cursa o segundo ano de Medicina na UFPR. Ele conta que a iniciativa – extensão de um projeto do qual ele participa no ambulatório – também é uma forma de dar aos novos alunos a possibilidade de iniciar o curso com mais prática do que o currículo permite. “No começo é um período muito mais teórico. Então, damos a oportunidade para alunos já terem contato com o ambiente hospital. E eles aproveitam para fazer o bem”, explica.
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A decisão de dar aos calouros uma recepção diferente nasceu de um projeto que desde o ano passado busca aliviar a dor das crianças que passam por tratamento no ambulatório Menino Jesus de Praga, mantida pela Associação Paranaense de Apoio à Criança com Neoplasia, no complexo do Hospital de Clínicas da UFPR. A unidade recebe cerca de 50 meninas e meninos por semana que enfrentam câncer no sistema linfático ou vascular. Entre quimioterapias, remédios e procedimentos cirúrgicos, eles aprendem a lutar pela cura de um jeito mais suave.
“É muito bom ver esse tipo de atividade aqui”, comenta Jucilene do Rocio Ribeiro, que acompanha uma vez por semana a filha Letícia Ribeiro no ambulatório. Com 10 anos, Letícia já enfrentou um linfoma, recuperou-se e em 2015 foi diagnosticada com leucemia. Agora, aguarda o transplante de medula óssea, que deve ser feito em breve. “Quando ela vê que tem gente diferente já vai perguntando quem é. Essas brincadeiras ajudam demais e deixam a gente mais feliz”, declarou a mãe, que hoje foi acompanhar a filha em uma sessão de quimioterapia.
Trotes
Pronta para iniciar o curso de Medicina, Isabela Perin, de 18 anos, percebeu na ação de seus veteranos uma forma de ampliar o horizonte de quem está chegando à faculdade agora. Ela conta que o projeto, do qual quer continuar participando, ajuda a romper o foco teórico do curso e mais: dá ainda mais orgulho da profissão que escolheu. “É muito legal. Isso é tão inspirador que dá ainda mais vontade de seguir na profissão”, comenta a caloura.
Trotes de iniciativas “saudáveis” têm ganhado fôlego no país na medida em que as recepções que expõem demais os alunos vão ficando para trás. No Rio de Janeiro, universidades públicas são proibidas por lei de qualquer tipo de trote, mas não inclui neste universo “atividades de acolhimento, recepção, lúdicas e de confraternização, bem como atividades acadêmicas e políticas, palestras, debates e afins” que não causem humilhação ou qualquer tipo de dano – moral ou físico – aos estudantes.
A medida foi publicada em Diário Oficial do RJ em outubro do ano passado. Um ano antes, a Assembleia Legislativa de São Paulo havia determinado medida semelhante.
No Paraná, não há lei que restringe qualquer tipo de atividade de recepção aos calouros, mas as universidades estaduais, por exemplo, são incentivadas a praticaram o trote cidadão.
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