Modelo em gestão de mobilidade urbana para o restante do país nas décadas de 1980 e 1990, Curitiba agora pode assistir à implantação de soluções que já foram usadas na capital mais congestionada do Brasil: São Paulo. Das 30 emendas dos vereadores ao novo Plano Diretor da capital paranaense sobre o tema, quatro já estão em funcionamento nas vias paulistanas.
Curitiba e o plano da “não mobilidade”
Conheça as linhas gerais do novo Plano Diretor da capital paranaense
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Para o vereador Jonny Stica (PT), relator do Plano Diretor na Comissão de Urbanismo, Obras Públicas e Tecnologias da Informação, as emendas não são meras cópias. “São Paulo também não criou nada. São conceitos internacionais. Em Madrid, por exemplo, há estacionamentos nos intercambiadores para troca de modais. O que ocorre é que São Paulo vive uma situação caótica no trânsito e teve de buscar o que há de melhor no mundo para que a cidade andasse. Curitiba até cresceu de forma planejada, mas não vinha se atualizando”.
O Plano Diretor de Curitiba será debatido pelos vereadores nesta segunda-feira (5). A votação começará pelo texto original enviado pela prefeitura e depois serão analisadas as mais de 194 emendas sugeridas pela Câmara. A ideia inicial é de que a votação transcorra entre segunda, terça e quarta-feira – podendo haver sessões extras no dias subsequentes caso seja necessário.
Conheça as quatro propostas importadas de São Paulo e o sucesso (ou insucesso) de cada uma delas:
Bilhete único temporal
Criado 11 anos atrás, o Bilhete Único paulistano é sucesso de público e crítica. Atualmente, apenas 6% dos passageiros pagam a tarifa com dinheiro nos ônibus de São Paulo. Lá, o usuário pode viajar com o cartão em até quatro ônibus diferentes, em um intervalo de três horas, pagando apenas uma tarifa. Existe também integração com trens da CPTM ou com o Metrô – nesse caso, paga-se apenas a metade do valor do segundo modal. Em Curitiba, Roberto Gregório, presidente da Urbs, costuma afirmar que a integração temporal traria um aumento de 13% nos custos do sistema.
Segundo a Urbs, o conceito estrutural do transporte coletivo de Curitiba foi baseado no sistema de metrô, o que permitiu que a cidade tivesse ônibus com alta capacidade. Quem vem de um município vizinho tem possibilidade de integração com o sistema de Curitiba, sem pagar outra passagem. É a chamada integração física, que pode ser complementada com a integração temporal e temporal matricial (com tempo e local definidos).
A Urbs informou que está elaborando um projeto para a adequação dos pontos de parada na Cruz do Pilarzinho, para permitir a parada de pelo menos quatro ônibus por sentido, permitindo a integração temporal matricial. O órgão também disse que está negociando uma parceria com o Banco Mundial para estudar melhor o assunto, a fim de evitar a evasão de receitas do sistema em razão da utilização de um bilhete único e também para encontrar uma forma de absorver o aumento de custos que a implantação do dispositivo traria.
Uma pesquisa feita pela Urbs nas linhas convencionais Primavera, Bracatinga, Jardim Kosmos e Vila Nori mostra que 11% dos passageiros dessas linhas utilizariam a integração. Ou seja, 1.100 dos 10 mil passageiros transportados/dia (somando as quatro linhas). Também está em estudo a implantação da temporal matricial nas linhas que atendem a região da Mateus Leme e do Jardim das Américas.
A Curitiba de 2024. Entenda
Veja as principais modificações propostas pelo novo Plano Diretor da cidade para a próxima década
Em entrevista à Gazeta do Povo no ano passado, Adalto Faria, diretor de gestão econômico-financeira da STrans, disse que o modelo havia trazido um ganho imediato de 3% na arrecadação em dias de semana e 7% aos finais de semana. Cerca de 30% das viagens nos ônibus de São Paulo, porém, são realizadas dentro do intervalo de três horas sem cobrança adicional de valor. Os dados são do segundo semestre de 2014, portanto antes da adoção do bilhete único diário e semanal. Mas essas viagens “gratuitas” do Bilhete Único são questionadas. A prefeitura de São Paulo paga R$ 1,9 bilhão por ano de subsídio. Estima-se que a alta dos custos do país fará essa conta pular para R$ 2,5 bilhões.
A ideia dos vereadores autores da proposta para Curitiba –Jonny Stica, Bruno Pessuti e Helio Wirbiski –é parecida com a de São Paulo: permitir que o usuário do transporte público utilize a rede quantas vezes forem necessárias ao longo do período em que o bilhete for válido. No fim da emenda, os vereadores dizem que “o bilhete único em conjunto com as pesquisas de origem e destino realizadas pela Urbs podem render otimizações de itinerários”.
Bolsão de parada para moto
Desde 2013, motociclistas de São Paulo têm uma área de parada para o semáforo vermelho antes da faixa de pedestres. Fortaleza ganhou esse elemento de controle de tráfego em maio deste ano. O vereador Chico do Uberaba propôs uma emenda ao plano diretor para criar um modelo semelhante em Curitiba. Na capital paranaense, esse “bolsão de parada” já existe para ciclistas na Avenida Sete de Setembro. Na justificativa apresentada pelo legislador, a iniciativa proporcionará “maior segurança para as motocicletas, diminuindo o conflito com automóveis no momento da largada no verde do semáforo”. São Paulo já teve até faixa exclusiva para circulação de motos. E não deu certo. Implantada em 2006 na Avenida Sumaré e Rua Vergueiro, as faixas foram abandonadas alguns anos depois após a cidade ver aumentar a quantidade de acidentes e atropelamentos nesses trechos. Os bolsões continuam em vigor.
Táxis nas faixas exclusivas
Segundo o banco de dados BRTData, que reúne informações de centros de excelência, institutos de pesquisa e empresas fabricantes de ônibus, atualmente 33 cidades no Brasil têm faixas exclusivas, em canaletas ou não, para a passagem do coletivo de trânsito rápido, o BRT. Elas são fundamentais para facilitar o fluxo e dar mais agilidade ao modal que mais transporta gente dentro de uma cidade, com exceção daquelas que têm trem e metrô também.
Ao todo são mais de 120 corredores, que transportam 11,9 milhões de passageiros por dia no país. Em Curitiba, são nove corredores, sendo seis em canaletas e três em faixas exclusivas (ruas XV de Novembro e Desembargador Westaphalen e Avenida Marechal Deodoro). Apenas nas faixas exclusivas, são mais de 160 mil pessoas transportadas diariamente, em 46 linhas de ônibus. Será que elas se importariam em dividir o espaço com os passageiros dos táxis de Curitiba?
Há uma emenda, feita por vários vereadores, que sugere o uso das três faixas exclusivas existentes hoje na cidade pelos taxistas. Os trechos somam cerca de quatro quilômetros, apenas, mas a intenção da prefeitura de Curitiba é de chegar a 20 quilômetros em breve, implantando faixas exclusivas em mais vias.
Segundo o presidente do Sindicato dos Taxistas, Abimael Mardegan, o pedido para usar as faixas partiu da categoria e foi entregue também à Secretaria Municipal de Trânsito de Curitiba. “Entendemos que os passageiros dos táxis também têm direito de acessar um transporte mais rápido.” Para Mardegan, o uso das faixas seria crucial principalmente nos horários do pico. O pedido da categoria não inclui as canaletas, por questões de segurança de trânsito.
Em São Paulo, o uso das faixas pelos táxis já rendeu muita polêmica. A permissão para o uso foi dada pela então prefeita Marta Suplicy. Nove anos depois, em 2013, um estudo feito pela Secretaria Municipal de Trânsito da capital paulista para o Ministério Público do estado chegou a uma conclusão um tanto controversa – e negativa para os táxis. Foram contados 3,78 táxis para cada ônibus no corredor nos horários de pico. Resultado: a velocidade média dos coletivos caía, prejudicando o transporte de passageiros.
Em março do ano seguinte, com base nesse estudo e em outros dois levantamentos, a permissão para a circulação dos táxis nas faixas exclusivas foi revogada. Meses depois, entretanto, em setembro de 2014, a prefeitura de São Paulo refez estudos e constatou que, fora do horário de pico, a circulação dos táxis nos corredores não atrapalhava os ônibus. Então nos períodos mais tranquilos do dia, os veículos podem utilizar as faixas exclusivas.
Os novos estudos foram criticados à época por alguns especialistas, porque eles não teriam considerado algumas particularidades, como as faixas que ficam em vias mais estreitas da capital paulista e que poderiam ter o fluxo afetado mesmo fora do horário de pico.
Estacionamentos intermodais
Anexadas ao projeto do novo Plano Diretor de Curitiba há também duas emendas prevendo a instalação de estacionamentos intermodais próximos aos terminais de transporte coletivo. Uma das propostas, do vereador Helio Wirbiski, prevê também que a receita advinda da publicidade que será veiculada nessas áreas possa subsidiar o preço do estacionamento, tornando-o mais barato que a média de cada região. “Esta emenda está ligada a outra, a dos polos de desenvolvimento, focada nos centros de bairro, e com a ideia de promover a integração de Curitiba com as cidades da região metropolitana, facilitando o fluxo das pessoas que vêm para a capital. O preço mais barato desses estacionamentos serviria como um incentivo para o morador da RMC deixar o carro ali e pegar o ônibus até o centro de Curitiba”, explica o vereador.
Ele diz que a forma como isso seria feito ainda não está definida. Se a prefeitura cederia terrenos públicos ao setor privado e o empresário ofereceria um preço menor em razão disso e de outros incentivos ou se o subsídio faria parte formalmente do sistema, permitindo que o usuário pagasse o estacionamento com o cartão-transporte, por exemplo. “Isso terá de ser melhor definido mais tarde”, comenta.
Essa ideia já funciona em São Paulo, sob a responsabilidade da operação do metrô, ligado ao governo estadual paulista. O E-Fácil, como é chamado por lá, permite que o usuário deixe o carro no local por até 12 horas ao custo de uma taxa que varia de R$ 8,42 a R$ 10,05 mais o valor de duas passagens (ida e volta), para utilizar o metrô, o trem ou o sistema de ônibus. São três estacionamentos E-Fácil –Estação Santos-Imigrantes, Estação Corinthians-Itaquera e Guaianazes CPTM –, com total de mais de 800 vagas.
A ideia começou em 2008, com o lançamento de seis áreas nos dois anos seguintes, mas de lá para cá sofreu mudanças. Ainda em 2012, em reportagens veiculadas pela imprensa local, o Metrô de São Paulo informou que seguraria a expansão das áreas de estacionamento porque, devido à superlotação de alguns braços do sistema, precisava focar na expansão do modal como prioridade.
Outra possibilidade levantada é a de que como alguns dos estacionamentos implantados ficam em áreas centrais da capital paulista eles não teriam o movimento esperado e não serviriam como incentivo para o uso do transporte público –seriam apenas uma opção mais barata para se deixar o carro. Isso é o que teria levado o Metrô de São Paulo a conceder duas dessas áreas à iniciativa privada para a exploração de estacionamentos a preços populares, não mais integrando o sistema de bilhetagem.
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