Tudo o que a escola estadual professora Flavina Maria da Silva, em Campo Grande (MS), recebeu em 2009, na última reforma, foi pintura nova e ampliação de uma sala.
“Não tínhamos nenhuma perspectiva, a curto prazo, de uma nova reforma significativa”, diz o diretor do colégio, Everaldo Monteiro da Silva.
Mas a obra aconteceu agora, seis anos depois da última, sem onerar os cofres públicos: foi feita com mão de obra e dinheiro de presos. A unidade será oficialmente reinaugurada em 9 de setembro.
As novidades na escola são o revestimento de cerâmica na cozinha e a cobertura na entrada, que não existiam. Forro das salas, luminárias e calçamento foram trocados.
Já é a quarta reforma de escola pública em Campo Grande bancada por presos, como parte de um projeto regulamentado no ano passado pelo juiz Albino Coimbra Neto.
“Usar o trabalho prisional para qualquer obra pública é relativamente comum. A grande novidade que foi introduzida é que o próprio preso é quem paga”, diz o juiz. Pelo trabalho, o detento ganha redução de pena.
Segundo a Lei de Execução Penal, o poder público pode descontar uma porcentagem dos salários dos presos para cobrir despesas de manutenção do condenado na cadeia. Em Campo Grande, em vez de o dinheiro ser usado nos presídios, foi destinado para bancar as obras nas escolas públicas.
O desconto é de 10%. O dinheiro é depositado em uma conta judicial e geralmente paga as reformas dos presídios. Mas Neto interpretou que a despesa de manutenção também envolve o oferecimento de trabalho para o condenado.
“A partir disso, me surgiu a ideia de fazer algum trabalho com os presos em semiaberto em ambientes públicos, coletivos, onde as pessoas pudessem ver de perto o que o preso pode fazer”, conta.
Nos quatro colégios, a economia para o Estado já foi de R$ 1,2 milhão, segundo o juiz.
Em cada escola, trabalharam em média 13 presos, que recebem, cada um, cerca de um salário mínimo (R$ 788). Um dos presos chegou a trabalhar na reforma das quatro unidades. Outro era ex-aluno de um dos colégios.
“Se o Estado fosse reformar uma escola no método tradicional, com licitação para empresas privadas, cada obra custaria cerca de R$ 350 mil. Nesse modelo novo, a única coisa que o Estado paga é o salário do preso”, diz Neto.
De acordo com o juiz, para 45 dias de trabalho, o gasto não chega nem a R$ 15 mil. “O mais forte é que o preso, sabendo que está pagando, se sente mais participativo e integrado à sociedade.”
Em Campo Grande, existem cerca de 1.500 presos em regimes aberto e semiaberto. Para o diretor da escola, o projeto faz parte de um anseio da comunidade de que “o interno pague de alguma forma o prejuízo que causou à sociedade”. “Estávamos precisando de algo que desse dignidade ao preso”, diz.
Segundo a secretária de Educação de MS, Maria Cecilia Amendola da Motta, o órgão assinou neste ano um termo de cooperação para o projeto atingir o maior número possível de escolas. “Além de contribuir com a ressocialização dos presos, deixa as escolas com melhores condições para a aprendizagem.”
Nas palavras do juiz Albino Neto, a medida já virou uma “política de Estado”.