Rosanne Bloom e a família haviam se sentado no voo de Filadélfia para as Ilhas Turks e Caicos na manhã de Natal quando dois funcionários da companhia aérea informaram que ela, o marido e os dois filhos deveriam sair do avião. Sua bagagem já havia sido removida. O problema? Rosanne havia informado aos tripulantes que os filhos adolescentes tinham alergia severa a vários tipos de castanhas.
“Eu disse que tínhamos os remédios necessários, que havíamos trazido nossa própria comida e estávamos confortáveis no avião. Até me ofereci para assinar um formulário de renúncia. Dois minutos depois já estávamos fora do avião”, afirmou Rosanne, ortodontista de Clarksville, Maryland.
Matt Miller, porta-voz da American Airlines, afirmou que essas decisões ficam a cargo dos pilotos. “O piloto determinou que seria melhor para a família não viajar com base na gravidade da alergia e a necessidade de fazer meia volta se qualquer pessoa comesse algum tipo de noz no avião”, afirmou.
As companhias aéreas têm uma longa tradição de servir castanhas durante o voo e muitas vezes essa é a única opção. Contudo, a prática também representa um desafio para aqueles com formas graves de alergia, que podem sofrer uma reação pelo simples fato de tocar uma superfície que foi exposta a algum tipo desse alimento.
Tensões
Entretanto as tensões entre passageiros com alergias alimentares e tripulantes de aviões aumentaram nos últimos anos, quando as companhias aéreas começaram a colocar em prática regras mais rígidas em relação ao embarque de passageiros. No passado, os pais de crianças pequenas podiam embarcar na frente, o que dava a chance de limparem assentos, mesas e braços das poltronas, de forma a limitar o risco de exposição a alérgenos. Contudo, atualmente muitas companhias aéreas deixaram de permitir que as famílias com filhos pequenos embarquem antes dos demais passageiros.
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Quando as famílias pedem permissão para realizar o embarque adiantado – ou questionam se haverá algum tipo de castanha – correm o risco de ser tirados do voo ou são ameaçados disso, afirmou Mary Vargas, advogada cuja família quase foi retirada de um voo de Londres para os EUA em dezembro por causa de uma alergia do mesmo tipo.
As famílias com alergias a castanhas estão impondo um desafio legal a essas políticas. Duas queixas formais foram abertas no Departamento de Transportes no último mês acusando a American Airlines de discriminação contra passageiros com alergias. As reclamações citam as políticas de pré-embarque da companhia, que proíbem o pré-embarque de pessoas com alergias, mas não de outros grupos de passageiros.
“O que queremos é poder viajar de avião como qualquer outra pessoa nos Estados Unidos”, afirmou Mary Vargas, a advogada que representa as famílias.
Estatísticas
Ainda que ninguém registre o número de emergências em aviões, estudos indicam que elas são relativamente incomuns durante voos e afetam uma pequena fração dos 3,6 bilhões de passageiros que voam a cada ano. Dores no peito e eventos cardiovasculares são as razões mais comuns para que aviões desviem de suas rotas em função de emergências médicas. Reações alérgicas representam menos de 4% de todas as emergências durante voos, de acordo com um estudo publicado em 2013 pela revista científica Western Journal of Emergency Medicine.
A American Airlines, que opera uma das maiores frotas de aviões do planeta, nem mesmo serve esse tipo de alimento durante o voo. Contudo, a empresa conta com uma política em que afirma: “Pedidos para que determinados alimentos não sejam servidos durante a viagem, incluindo nozes, não poderão ser aceitos. Não é possível oferecer áreas de segurança contra alergias, nem podemos permitir que os passageiros embarquem antes dos demais para limpar assentos e mesas”.
“Além disso, não é possível garantir que nossos clientes não serão expostos a amendoins e nozes durante o voo, e permitir que pacientes com alergias embarquem previamente pode criar a falsa impressão de segurança, uma vez que isso não elimina os riscos”, afirmou Miller.
Pessoas que sofrem de alergias alimentares severas e mortais podem apresentar inchaço e dificuldade para respirar, mesmo quando a exposição é limitada. Elas geralmente carregam uma injeção de epinefrina, medicamento capaz de reverter os sintomas. Contudo, no caso de uma reação severa, a pessoa ainda pode precisar de acesso imediato a um hospital.
Pesquisas mostram que medidas como a criação de zonas livres, nas quais os passageiros são orientados a não comer derivados de castanhas, e a limpeza prévia de assentos e mesas podem ajudar a reduzir o risco de uma reação alérgica em pleno voo.
Reação
Uma das reclamações, oficializada no dia 28 de dezembro, é a de Nicole Mackenzie, mãe de uma criança de 7 anos com alergias graves a amendoim, nozes e sementes. Ela não recebeu permissão para embarcar antes dos outros passageiros e limpar o assento antes da viagem da família de Portland, no Oregon, a Charlotte, na Carolina do Norte. A segunda reclamação foi realizada no dia 10 de janeiro em nome da Food Allergy Research & Education (FARE), organização que representa pessoas com alergias alimentares.
“A ação da American Airlines foi claramente discriminatória. Ela tem uma política definida no site, e as únicas pessoas discriminadas no pré-embarque são as alérgicas”, afirmou o CEO e diretor médico da FARE, Dr. James Baker Jr.
Lianne Mandelbaum, cujo filho é alérgico, acompanha as experiências de viajantes com alergias em seu site, o “No Nut Traveler”. Ela afirmou que cada companhia aérea define as próprias regras, mas que as políticas não são aplicadas de forma consistente, de forma que os viajantes muitas vezes não sabem o que esperar quando fazem planos de viagem.
“É como uma roleta russa”, afirmou Michael Silverman, psicólogo de Nova York, cuja filha de 13 anos, Sydney, tem uma alergia grave, mas que não gosta de falar sobre o assunto por medo de ser expulso de aviões.
O Departamento de Transportes está investigando as reclamações, afirmam as autoridades, acrescentando em um e-mail que alergias graves são consideradas uma deficiência de acordo com a Lei de Acesso aos Transportes Aéreos, que regula as viagens aéreas, caso impeçam o indivíduo de respirar ou “tenham impacto significativo sobre qualquer atividade da vida”. A indústria de alimentos derivados de nozes fez lobby contra a restrição do consumo de nozes em aviões e o Congresso proibiu o Departamento de Transportes de impor qualquer restrição.
Algumas companhias aéreas são mais abertas aos passageiros com alergias alimentares. A Jet Blue estabelece uma “zona livre” em torno de passageiros com alergia. A Southwest evita servir nozes e amendoins caso os comissários de bordo sejam informados da presença de algum passageiro alérgico no voo. A política da Delta também consiste em evitar servir amendoins caso haja um passageiro alérgico a bordo.
Entretanto, entrevistas com quase uma dúzia de famílias e jovens adultos com alergias alimentares graves sugere que muitas pessoas têm medo de ser retiradas do voo, caso peçam para que os comissários não sirvam amendoins.
Ana Govorko, administradora hospitalar de Princeton, Nova Jersey, afirmou que em julho do ano passado ela, a filha adolescente e um filho adulto foram obrigados a desembarcar de um avião da Lufthansa com destino a Nova York vindo de Munique e Trieste, na Itália. Ela havia informado à atendente que sua filha sofria com alergias graves e estava carregando o medicamento necessário. A família esperou no aeroporto por sete horas tentando encontrar outro voo, enquanto funcionários da companhia “faziam piada com as alergias”, afirmou Ana. “Eles foram muito rudes. Foi chocante”.
Ela conseguiu embarcar em outro voo da Lufthansa com destino a Newark no dia seguinte. A porta-voz da Lufthansa, Christina Semmel, afirmou que a família Govorko foi autorizada a voar após apresentar uma carta do médico da filha, mas Ana conta que mostrou a carta quando tentou embarcar no primeiro voo.
Laura Ilsley, mãe de dois filhos que vive em Travis, na Califórnia, teve uma experiência similar em abril do ano passado, quando ela e o marido, que é militar, estavam vindo de Incirlik, na Turquia, ao lado do filho e da filha de quatro anos, que tem alergia grave a amendoins.
Quando Laura informou a Air France sobre as alergias da filha, os agentes da companhia aérea afirmaram que a tripulação planejava servir amendoins e que eles não poderiam alterar os planos, de forma que a família “não era bem vida a bordo”, afirmou ela. Por fim, um gestor da Air France conseguiu colocar a família em um voo da Delta, onde um membro da tripulação comunicou os passageiros de que uma criança com alergia grave a amendoins estava a bordo e que a empresa os substituiria por pretzels e biscoitos.
“A tripulação foi muito gentil e prosseguiu sem nenhum problema”, contou Laura.
Em um comunicado oficial, a Air France afirmou que a tripulação “determinou que não seria seguro para os passageiros embarcarem no voo sem avisarem do problema com antecedência”, e que “o caso colocou a segurança do passageiro como a principal prioridade”.
A filha de Silverman, Sydney, afirmou que teve uma ótima experiência quando viajou pela Delta de Palm Beach, na Flórida, a Nova York em um fim de semana prolongado. Uma comissária de bordo notou que ela estava limpando o assento e perguntou se ela era alérgica a amendoins. Sydney disse que sim, mas que não havia problema se ela servisse nozes e amendoins aos passageiros.
Ainda assim, a atendente “se voltou às pessoas na fileira à minha frente e na de trás e perguntou se elas se importavam se não pudessem comer amendoins durante o voo. Todos disseram que não havia problemas”, contou Sydney. “Então ela avisou a todos os passageiros que não haveria amendoins no voo porque havia um passageiro com alergia. Ela também pediu para que ninguém comesse amendoim, caso tivesse trazido de casa”.
“Eu me senti muito grata por isso. Ninguém havia feito algo assim por mim antes.”
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