Há seis anos, uma parceria do Ministério Público e órgãos de educação do estado adotou a Fica, Ficha de Comunicação do Aluno Ausente. O mecanismo, se bem usado, pode ajudar a desembaraçar o novelo do abandono escolar. Havendo cinco faltas consecutivas ou sete faltas alternadas o professor preenche o formulário e o encaminha à direção, para que os pais sejam chamados. Em etapas posteriores, a Fica vai parar nos conselhos tutelares, para que as conselheiras façam uma abordagem mais próxima das famílias, provocando o retorno da crianças e do adolescente à escola.
Apesar das boas intenções, a Fica ainda não mostrou a que veio. Sua implantação para valer tem coisa de dois anos e sobram lacunas na apuração dos dados. Arrisca virar mais um procedimento burocrático. A estimativa é que 60% dos municípios paranaenses tenham adotado o instrumento, mas até o fechamento desta edição a reportagem não teve acesso a quantos formulários foram preenchidos no ano passado. O balanço parcial em três núcleos Goioerê, Cianorte e Foz do Iguaçu , somando 29 municípios, conta 441 fichas de ausência. Segundo a Secretaria de Estado da Educação, 75% dos alunos retornaram e 5% foram encaminhados ao Ministério Público. Na prefeitura, a informação é de que ano passado 2 mil Ficas foram preenchidas e apenas 500 obtiveram retorno dos conselhos tutelares 30% de famílias responderam ao fantasma da evasão.
É provável que seja um recorde, dadas as condições em que esses locais funcionam. No Conselho Tutelar do Pinheirinho um dos maiores da cidade há até uma piada em relação à Fica. "Fica... em cima da mesa", lamenta a conselheira Jussara da Silva Gouveia, diante de mais de 150 fichas, apenas das escolas do município. Há alguns meses as estaduais deixaram de encaminhar alunos para o conselho, uma medida para a qual ainda não se encontrou explicação.
A reportagem acompanhou uma tarde de trabalho da conselheira Jussara Gouveia, pelas vilas da região do Tatuquara, e conferiu a prova de obstáculos a que os conselheiros estão submeditos no acompanhamento da Fica. A primeira delas é achar as famílias dos "evadidos" em ruas sem placa com o nome, números irregulares, zonas de risco e situações que geram abalo emocional. A tarefa é convencer a família e participar da vida escolar e devolver seus rebentos ao ensino. Mas não raro o visitante é convocado a virar um super-homem na luta contra a miséria, a falta de saneamento e, o pior, a violência. Ao lado do desinteresse de muitos pais, o crime tem afastado crianças e adolescentes da educação.
O "repasse de responsabilidade" em que se transformou a Fica já incomoda o Ministério Público, o que tem levado os promotores a repensarem o projeto. A proposta é formar grupos multidisciplinares nas escolas, com médicos, psicólogos, educadores, e atender mais de perto os casos complicados. (JCF)