Os buracos no asfalto lideram o ranking de dores de cabeça causadas à população de Natal (RN) e Teresina (PI). Em Curitiba, são os carros estacionados de forma irregular que preocupam. Pelo menos são esses os problemas urbanos que mais motivam a indignação da população nas reclamações mais registradas no aplicativo Colab, que reúne cidadãos e prefeituras em uma rede. Pelos perfis comuns, é possível fazer reclamações, solicitações e sugestões. As prefeituras recebem os dados organizados e podem responder o usuário.
A iniciativa é uma das utilizadas nas cidades brasileiras, que começam a investir em tecnologia para encurtar a distância entre governo e cidadão. A inovação tecnológica é um ambiente propício para estabelecer uma via de mão dupla entre governo e cidadão. O caminho a percorrer é longo, e o sucesso depende da abertura dos dados públicos à população.
O Colab funciona como rede social. Uma linha do tempo lista as reclamações mais recentes. O usuário deve publicar uma foto, registrar o endereço e a categoria da solicitação. Esse último item é o que difere o aplicativo de uma reclamação no Facebook ou Twitter. Ainda que as prefeituras tenham equipes para monitorar as redes sociais, categorizar os pedidos conforme a gestão pública torna muito mais rápido o processo de encaminhar para o setor responsável.
A ideia de um canal direto com a administração não é nova. Muitas cidades mantêm centrais 156, telefone que reune todo o contato do cidadão com a administração municipal. A migração para novas plataformas digitais é em parte uma imposição cultural. As pessoas utilizam cada vez menos o telefone para fazer ligação. E cada vez mais as redes sociais para reclamações e denúncias. Mas é também a oportunidade de tornar a gestão da cidade mais inteligente.
Gustavo Maia, co-fundador do Colab, explica que o aplicativo fornece dados que os municípios podem utilizar não apenas na solução de problemas pontuais, mas no desenvolvimento de políticas públicas. Um mapa de calor que reúna as infrações de trânsito mais comuns ajuda a direcionar fiscais para aquela área, por exemplo. Também é possível reunir demandas semelhantes para otimizar o trabalho. Uma equipe que taparia um buraco no asfalto em cada canto da cidade pode fechar vários em um mesmo bairro e por aí vai.
No Rio de Janeiro, a prefeitura lançou seu próprio aplicativo. O Portal 1746 é integrado com o Centro de Operações do Rio (COR), criado em parceria com a empresa de informática IBM, que reúne 30 órgãos ligados à administração. Uma vez que a solicitação é publicada, o setor responsável tem 48 horas para responder. Nas secretarias que cumprem a meta, os funcionários recebem bônus salariais no fim do ano, segundo o coordenador de Mídias Digitais do município, Pedro Serápio.
“É uma mudança cultural. Você faz a solicitação e vê que tem um acompanhamento, não fica só torcendo para que aquilo se resolva”, defende Serápio. Lançado em 2012, o aplicativo ganhou uma segunda versão dois anos depois, em um Hackaton. A prefeitura organizou a “maratona hacker”; durante 80 horas, programadores e designers trabalharam para sugerir melhorias.
Dados abertos
Os hackatons trabalham na outra ponta, em que a própria comunidade produz tecnologia para melhorar a cidade. Cabe ao poder público ofertar os dados, e alguns municípios se abrem para isso. Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife contam com portais específicos de dados abertos, onde é possível fazer o download de uma série de planilhas com as informações brutas, os chamados microdados.
Muitas informações já estão disponíveis, basta cruzá-las e disponibilizar em plataformas acessíveis ao usuário, explica o professor Leandro Escobar, da especialização em Big Data da Universidade Positivo. É possível cruzar o número de carros em tempo real com informações demográficas e meteorológicas, por exemplo, e estimar o número de veículos nas ruas em um dia de chuva, ou estimar a frota de uma cidade daqui a cinco anos.
Um dos entraves para os desenvolvedores é a ausência de uma “plataforma tecnológica”, na opinião de Almir Meira Alves, professor da Fiap, faculdade com foco em tecnologia. É fácil trabalhar com dados nacionais, com os do IBGE, mas não há um padrão para como estados e municípios divulgam suas informações. O que dificulta na hora de cruzar informações em planilhas com linhas na casa dos milhões.
Outro problema é a falta de transparência. Embora os municípios sejam obrigados a manter portais da transparência, pela lei de responsabilidade fiscal, muitos não cumprem ou cumprem pela metade. Dados antigos, incompletos, de difícil acesso ou mal organizados estão entre alguns dos problemas encontrados pela ONG Contas Abertas, que elenca 131 critérios em seu índice de transparência, que elenca os órgãos públicos com maior e menor abertura de dados.