Um adesivo azul se espalhou pelos comércios de Paris. É o sinal de que o local presta algum tipo de serviço gratuito para as pessoas em situação de rua. Refeições, duchas e acesso a kit de primeiros socorros são algumas das opções. Desde novembro, 323 estabelecimentos já aderiram ao “Le Carillon”, projeto do parisiense Louis-Xavier Leca.
A ideia é quebrar barreiras. Em pesquisa que fez um diagnóstico de como pensa a população de rua, a Associação Emmäus descobriu que 83% têm medo de comerciantes e transeuntes. Entre os muito jovens e idosos o receio é ainda maior, beirando os 90%.
Antes do projeto, muitos comércios já ofertavam cafés e acesso aos banheiros de forma gratuita. Mas os moradores de rua muitas vezes não iam, por não saber distinguir os locais em que seriam aceitos daqueles em que seriam rejeitados, conta Leca, em entrevista ao site CityLab.
Os estabelecimentos se cadastram na plataforma do “Le Carillon” e assinam um termo de compromisso em que prometem não usar o projeto como autopromoção. A ideia é “fazer o bem” e criar um ambiente de ajuda comunitária. Indivíduos também podem ajudar, indicando comércios para serem parceiros ou por meio de doações financeiras para a startup.
Os comerciantes têm a opção de rejeitar a ajuda, caso o indivíduo “se comporte mal”. Quem estiver sob influência de álcool e drogas, por exemplo, pode ser convidado a retornar depois, em melhor estado, explica Leca, na entrevista.
Mas, de forma geral, a relação entre os lados têm sido amigáveis. Pesa a favor a relativa receptividade do povo francês às pessoas que vivem nas ruas. Outro levantamento da Emmäus constatou que 56% dos franceses sentem que podem estar em situação de rua, em algum ponto das suas vidas. Os que se consideram “solidários” a esta população somam 75%.
Para quem vive na rua, a ajuda é questão de sobrevivência. Abrigo, comida e higiene são as maiores demandas desta população, pelos dados da Emmäus. Apenas 46% usam os banheiros nos abrigos. Outros dependem de cafés, banheiros públicos (muitas vezes pagos) ou a própria via urbana, quando há necessidade. Um terço não têm acesso à saúde, e pelo menos 12% já teve seu atendimento negado por algum médico.
O uso de símbolos facilita a comunicação com a população em situação de rua. Em 2010, mais de 90% dos moradores de rua da França eram de outros países. A maior parte (53%) era de imigrantes africanos, seguidos de outros países europeus (37%) e asiáticos (9%), segundo dados do relatório Homeless in Europe, da Feantsa, que reúne organizações de apoio a moradores de rua de toda a Europa.
Para os próximos meses, Leca planeja expandir a ideia para outros quatro distritos parisienses e quatro cidades francesas, além de chegar em Londres, na Inglaterra, e na Bélgica. Depois, o plano é chegar na América.
Sem relação
O projeto “Le Carillon” não tem relação com o bar de nome semelhante que um dos alvos dos atentados do grupo Estado Islâmico à capital francesa, em novembro do ano passado.