Desde quando deflagrou em 2014, a Lava Jato foi comparada inúmeras vezes - com razão - à Mãos Limpas, operação que investigou a corrupção nos níveis mais altos da política e do empreendedorismo da Itália. Entre 1992 e 1994, uma equipe de cinco magistrados do ministério público de Milão, liderados pelo juiz Antonio Di Pietro, sacudiu as fundações do país. Em dois anos, o judiciário emitiu cerca de 1.300 condenações e o valor da propina foi estimado em centenas de bilhões de euros. O estopim foi o descobrimento, em 17 de fevereiro de 1992, de uma pequena quantia de dinheiro, equivalente a 3.500 euros, paga por um empresário a Mario Chiesa, importante membro do partido socialista.
Durante as investigações e os sucessivos processos, as cúpulas de todos os grandes partidos, desde o partido socialista à democracia cristã, que haviam governado a Itália desde o pós-guerra foram decapitadas. Líderes, ex premiers, tesoureiros e ministros foram chamados a depor nos tribunais e sofreram pesadas condenações. O primeiro ministro socialista da época Bettino Craxi, em discurso no Parlamento, admitiu que o caixa dois era prática comum em todos os partidos. Nas eleições de 1994, ele não conseguiu se reeleger e, tendo perdido a imunidade parlamentar e temendo ser preso a qualquer momento, fugiu para Tunísia onde viveu até sua morte em janeiro de 2000. Enquanto foragido, foi condenado a mais de dez anos de prisão.
Durante sua carreira política, Silvio Berlusconi, apelidado de “il cavaliere”, tirou proveito de seu cargo e de seu poder midiático. Percebendo a lacuna política criada pelas condenações da operação Mãos Limpas – que acabou com os quatro maiores partidos italianos –, ele criou um partido próprio e conseguiu se eleger. Como primeiro-ministro, conseguiu escapar de numerosos processos, sofrendo uma condenação por crimes fiscais só em 2013.
O vácuo deixado pela dissolução dos partidos tradicionais foi preenchido por pequenas legendas de oposição como a Liga do Norte, que lutava pela separação do país, e pelo Movimento Social Italiano, herdeiro do extinto partido fascista. Mas sobretudo pelo magnata Silvio Berlusconi, que representava uma figura de ruptura externa ao sistema político. Em poucos meses, o empresário fundou o movimento Forza Italia e, com o apoio de seus tevês, conquistou as eleições, tonando-se primeiro ministro, em março de 1994. Berlusconi dominou a cena política italiana durante 20 anos, mostrando que as consequências de Mãos Limpas se estendem até hoje.
Apesar do apoio popular e da mídia, a equipe de juízes sofreu duros ataques por parte da política, recebeu ameaças de morte e foi vítima de complôs e dossiês. Sob as pressões, no final de 1994, Di Pietro abandonou a magistratura e as investigações. Foi o fim de Mãos Limpas. No entanto, sua aprovação popular havia atingido 80% e ele era visto como um verdadeiro herói nacional. Em 1996, aceitou o cargo de ministro no recém-empossado governo de centro-esquerda de Romano Prodi e, em 1998, fundou seu partido Itália dos Valores, cujo objetivo era a moralização da vida pública. Em 2012, um suposto escândalo sobre seu patrimônio, revelado por uma investigação jornalística, pôs fim a sua experiência política.
Ironicamente, Berlusconi era um dos principais financiadores de Craxi e do partido socialista e também estava envolvido na investigação. Isso, porém, não impediu que convidasse dois magistrados de Mãos Limpas, Antonio Di Pietro e Piercamillo Davigo, para integrar os ministérios e dar uma cara de moralidade ao novo governo. Ambos os juízes recusaram a oferta e optaram por continuar as investigações. Durante sua carreira política, Berlusconi, aproveitando de seu cargo e poder midiático, conseguiu escapatórias em numerosos processos, sofrendo uma condenação por crimes fiscais, só em 2013.
Di Pietro desistiu de investigações e da magistratura em 1994
Apesar do apoio popular e da mídia, a equipe de juízes que conduziu a operação Mãos Limpas sofreu duros ataques por parte da política, recebeu ameaças de morte e foi vítima de complôs e dossiês.
Sob pressão, no fim de 1994, o juiz Antonio Di Pietro abandonou a magistratura e as investigações.
Foi o fim das Mãos Limpas.
No entanto, a aprovação popular de Di Pietro havia atingido 80% e ele era visto como um verdadeiro herói nacional.
Em 1996, aceitou o cargo de ministro no recém-empossado governo de centro-esquerda de Romano Prodi e, em 1998, fundou seu partido, Itália dos Valores, cujo objetivo era a moralização da vida pública.
Em 2012, um suposto escândalo sobre seu patrimônio, revelado por uma investigação jornalística, pôs fim a sua experiência política.
Ironicamente, Berlusconi era um dos principais financiadores de Craxi e do partido socialista e também estava envolvido na investigação. Isso, porém, não o impediu de convidar dois magistrados das Mãos Limpas, Antonio Di Pietro e Piercamillo Davigo, para integrar os ministérios e dar uma cara de moralidade ao novo governo.
Ambos os juízes recusaram a oferta e optaram por continuar as investigações.
Multidão nas ruas
Em 30 de abril de 1993, no meio das investigações de Mãos Limpas, uma multidão de pessoas enfurecidas aguarda a saída do primeiro ministro Bettino Craxi em frente ao hotel Raphael, em Roma. A massa agita no ar notas de dinheiro aos gritos “Bettino, você quer essas também?”. Ao sair do prédio, o líder do partido socialista é recebido por uma chuvarada de moedas que atinge ele, a escolta e o carro.
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