“Até quando coisas tais continuarão a acontecer?”, questiona a juíza Maria Izabel Pena Pieranti, da 16ª Vara Criminal do Rio, na decisão que decretou a prisão temporária de um dos suspeitos de matar um homem dentro de uma estação do metrô na última sexta-feira, no Centro do Rio. O texto da magistrada, feito durante o plantão judiciário, no último domingo, chama a atenção pelo tom de desabafo.
“Ressalto que o acontecimento que vitimou fatalmente Alexandre de Oliveira e lesionou, por PAF’s, Diogo Pinto Muinos, é mais uma eloquente demonstração da desavergonhada criminalidade urbana que vem assolando, assustadoramente, esta cidade. A cada nova ocorrência similar vê-se que não se intimidam os delinquentes em agir em locais públicos, providos de câmeras e de vigilantes, muito movimentados, à luz do dia. Covardemente audaciosos e vorazes, buscam o ganho fácil, mesmo que a vítima seja pessoa humilde e de parcos recursos”, escreve a juíza, que emenda:
“Não poderia, pois, é óbvio, ficar inerte o Poder Judiciário, ante o gravíssimo quadro em questão, que mais uma vez abate sobre a sociedade. É de se perguntar retoricamente: - até quando coisas tais continuarão a acontecer?”.
Para a juíza, o papel do magistrado é agir com imparcialidade. Apesar disso, segundo ela, em algumas situações é difícil não se manifestar:
“Muitas vezes a gente acaba deixando transparecer a nossa opinião, o que acredito que foi o caso aqui. Por mais que eu me policie isso acontece, mas esse não é o propósito do Direito. O juiz deve ser imparcial, mas é possível mostrar de alguma forma a nossa opinião. O juiz não está só decidindo um caso concreto, ele também deve se manifestar como pessoa de alguma forma. O importante é que isso não seja feito com raiva, sem paciência. Eu costumo brincar que gostaria de ser sueca no sentido de ser mais fria. Mas eu não consigo, eu sou muito latina”, brinca.
Nascida no interior de Minas, a magistrada que chegou ao Rio ainda na adolescência, reflete sobre o momento que o carioca vive, e afirma que em sua opinião o papel do juiz , além de julgar casos concretos, também é provocar ações do estado:
“Eu acho que a sociedade está muito combalida com essa violência, e acho que de alguma forma nós juízes precisamos provocar uma ação dos agentes públicos a esse respeito enquanto nós tivermos leis que servem quase como uma proteção aos criminosos. Mas essa é uma opinião muito particular minha, nem todos os meus colegas pensam assim. Nós magistrados e mesmo a população já não toleramos mais esse estado de coisas”.
Juíza há cerca de 19 anos, ela conta que se encontrou na área criminal, onde acredita que pode fazer um diferença na sociedade, e questiona a falta de debate sobre a ressocialização dos presos, que para ela deveriam ser obrigados a trabalhar.
“Eu penso que corpo cansado não faz besteira. Esses presos deveriam trabalhar. São dois aspectos, de um lado é a educação, que previne as más condutas, e por outro lado é a questão do trabalho. Aquela pessoa que infringiu a lei, através do trabalho vai repensar sua posição como pessoa. Mas hoje, se uma pessoa for condenada ela não é obrigada a trabalhar. Se ela quiser pode passar o tempo todo no ócio, sem pensar no depois”, afirma a magistrada, que vê essa falta de obrigação como um problema para a sociedade:
“O encarceramento puro e simples não vai trazer nada de benéfico. Ele estará abrigado, tem comida, mal ou bem recebe uma assistência até mesmo mental, mas não tem o dever de dar nada em retorno. Nós somos onerados duplamente”.
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