Perto do fim do julgamento dos PMs acusados do massacre do Carandiru, entidades de direitos humanos apontam falhas na punição dos réus e nas indenizações às vítimas que podem reabrir o caso na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), levando o Brasil a ser processado na Organização dos Estados Americanos (OEA).

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Começa nesta segunda-feira, 31, a quinta e última fase do maior processo da história do júri no País. Nela são acusados 15 policiais do Comando de Operações Especiais (Coe), denunciados por oito mortes que poderão somar mais 1.440 anos de prisão à contabilidade de condenações. Somadas, as penas individuais do caso chegam ao recorde no júri de 20.156 anos de prisão para 58 PMs considerados culpados em três primeiros julgamentos.

O comandante da operação, o coronel Ubiratan Guimarães, foi absolvido pelo Tribunal de Justiça mesmo depois de ter sido condenado pelo júri. A invasão do Pavilhão 9 da Casa de Detenção de São Paulo ocorreu em 2 de outubro de 1992. A operação da PM deixou 111 mortos. O processo já dura quase 22 anos e acumulou 130 volumes, 111 apensos e 50 mil páginas.

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Em 2000, a CIDH publicou um relatório que recomendava o Estado brasileiro a indenizar as vítimas do Carandiru, entre outras providências, como condenar as autoridades envolvidas na ordem de invasão ao presídio. Como até agora a Justiça reconheceu o direito de apenas 64 ações, dentro 111 mortos e 87 feridos, ONGs como a Human Rights Watch e o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) avaliam se é a hora de reabrir o caso na Organização de Estados Americanos (OEA) e, até mesmo, processar o Brasil na corte internacional.

"Parte das recomendações da Comissão Interamericana foram descumpridas pelo Estado brasileiro", diz a diretora da HRW no Brasil, Maria Laura Canineu. Um dos sobreviventes que não foi indenizado é o pedreiro Luiz Carlos dos Santos Silva, de 45 anos. Ele não se conforma com o fato de, mesmo condenados, todos os PMs estarem soltos, inclusive os responsáveis pela tentativa de homicídio da qual foi vítima, com cinco tiros, três deles nas costas.

"Não resolveram nada e eu não posso perder tempo com isso aí. Não adianta condenar e não ir preso. Entrei com indenização e não resolveu nada." No último júri, ele se negou a testemunhar. Mal sabia que sua falta significaria enterrar de vez todas as chances de receber uma indenização do Estado.

Como Silva saiu da cadeia em 1998, seis anos após o massacre, seu prazo para entrar com uma ação contra o Estado havia acabado. Porém, a condenação dos réus acusados de tentar matá-lo reabriria o prazo para Silva. O problema é que os PMs foram absolvidos pelo júri pelas tentativas de homicídio - provavelmente porque os jurados não ouviram a versão da vítima.

Segundo especialistas em Direitos Humanos, o Carandiru é um exemplo do descompasso entre o sistema internacional e a Justiça brasileira. Desde 2000, por exemplo, todos os 86 crimes de lesão corporal leve denunciados pelo Ministério Público foram consideradas prescritos. Resta apenas um caso de lesão corporal grave, que deve ir a júri também. Essas agressões entram dentro dos relatos de sobreviventes que tiraram as roupas e, nus, tiveram de rastejar encurralados por um corredor polonês formado por PMs.

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Segundo a Promotoria, é impossível enquadrar esses crimes na Lei de Tortura, de 1997, que tornaria a imprescritível essa violência. Para a jurisprudência da OEA, no entanto, os crimes deveriam ser julgados mesmo assim. Foi esse o entendimento com relação às denúncias da Guerrilha do Araguaia, por exemplo.

"A tortura é um crime contra a humanidade e é imprescritível. O Brasil, naquilo que diz respeito aos Direitos Humanos, está submetido à Corte Interamericana", explica o diretor da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil da Seccional de São Paulo (OAB-SP), Martim Afonso de Almeida Sampaio.