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A morte da menina Rachel Genofre, de 9 anos, e a onda de crimes sexuais contra crianças noticiada em seguida no Paraná chocaram a população do estado. Ainda mais chocante, porém, talvez seja saber que essa é apenas a ponta do iceberg – estatísticas oficiais mostram que abusos sexuais contra menores de idade são muito mais comuns do que qualquer noticiário possa fazer supor.

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Só em Curitiba, o número de agressões registradas chega a mais de 500 por ano. É o equivalente a uma criança vítima de abuso a cada 16 horas. Mais de um crime por dia. Levando em conta todo o estado do Paraná, o intervalo cai para apenas seis horas. No total, todos os anos, cerca de 1,5 mil crianças sofrem com este tipo de agressão no Paraná. Os dados da Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente em Situação de Risco em Curitiba e do Sistema de Informação para Infância e Adolescência (Sipia).

E a situação pode ser ainda bem pior: de acordo com a psicóloga e técnica da Coordenação de Ações Protetivas da Secretaria de Estado da Criança e da Juventude, Ticyana Paula Begnini, estudos mostram que para cada notificação recebida existem outras vinte ocorrências que não são registradas. "Nós sabemos que o registro é subnotificado. Tem violência que não chega até nós", afirma.

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O fato de a violação acontecer, na maior parte dos casos, dentro de casa é um fator preponderante para a falta de registro preciso. Segundo Ticyana, em 87% dos casos de violência, inclusive sexual, o agressor é da família ou alguém de confiança. "A criança tem medo de falar, ou por se sentir co-responsável, ou por sofrer ameaças. A criança tem dependência do julgamento moral do adulto, ela não tem como avaliar a situação, por isso é necessário ter sempre uma conversa franca com ela e dar condições para que ela fale o que está ocorrendo", diz.

Para a coordenadora de Proteção Social Especial de Média Complexidade da Fundação de Ação Social (FAS), Marisa Mendes de Souza, o diálogo com a criança é uma ferramenta importante. "É importante ouvir a criança e acreditar nela. O adulto tem de oferecer ajuda", afirma. A preocupação de Marisa se explica – é comum que em casos de violência sexual exista a conivência de outros familiares.

"O agressor, normalmente, é o pai ou o padrasto. E a mãe é conivente", diz a pesquisadora da UFPR Araci Asineli da Luz, especialista em questões de infância e adolescência. "A mulher diz acreditar que precisa daquele companheiro. Temos casos de mães que abandonam os filhos que foram abusados para ficar com o companheiro", conta.

Araci ressalta porém que, hoje, os casos de violência sexual têm vindo mais à tona. "Aquilo que estava escondido tem vindo à tona. E até mesmo tem se somado a casos bárbaros, que não representam apenas questões domésticas", explica.

Para Araci, os últimos casos de violência sexual ocorridos no Paraná demonstram o perfil de nossa sociedade. "Antes de mostrar um indivíduo doente, temos uma sociedade doente que gera esse tipo de sujeito (agressor). Eles não surgem do nada. O que existe é a oficialização da violência sexual, com o agravante que a criança, além de ser abusada, é morta", diz.

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A onda de violência sexual contra crianças é explicada por Araci também pelo efeito midiático. "Estes indivíduos (agressores) se sentem invisíveis. Quando há divulgação de um caso, eles buscam visibilidade, sentem-se estimulados", explica. A especialista no assunto é taxativa. "Vamos ter outros casos assim ainda", diz.