Está escrito na ficha de um dos japoneses presos pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops): essas pessoas são incompreensíveis, segundo o delegado. Isso resume o que os japoneses passaram no Brasil. Só pelo fato de terem uma cultura totalmente diferente, diversos brasileiros tiveram dificuldades de compreender como os orientais pensavam e por que agiam de determinada forma.
Dentro da própria comunidade houve uma divisão logo depois do fim da Segunda Guerra: havia os que se declaravam vitoristas e os que diziam ser derrotistas. Os primeiros acreditavam que o Japão não havia perdido a guerra, mesmo que já houvesse a notícia oficial sobre o fracasso. Já os outros aceitaram a perda.
Na concepção dos vitoristas, o imperador era como um deus (vinha de uma dinastia ininterrupta) e o atual monarca era visto como um sucessor dos outros deuses que haviam criado o mundo (no caso, o Japão). Se o imperador, então, era alguém inviolável, ele jamais poderia perder a guerra porque era invencível.
A notícia sobre a derrota foi ainda interpretada de maneira deturpada pelos vitoristas: chegou aos jornais da época uma imagem do imperador assinando a rendição com um general dos Estados Unidos. "Para eles, era impossível o imperador assinar um documento com um simples general. Ele deveria estar ali com o rei (ou presidente) do outro país e não com um subordinado. Por isso pensaram que a foto era falsa", explica a historiadora Elena Shizuno.
Os vitoristas, depois disso, passaram a perseguir, dentro da própria comunidade, os outros japoneses que aceitaram a derrota. "Eles acreditavam que um dia voltariam ao Japão e, por isso, não conseguiram se tornar brasileiros. Queriam manter as tradições e impor isso a todos os outros", diz Elena.
Em 1953 teria havido um suicídio coletivo, em São Paulo, porque alguns orientais não aceitaram perder a guerra. Até hoje, a Segunda Guerra Mundial é um tema tabu para os japoneses mais velhos, que dificilmente querem falar do assunto.