Quando Lost morreu, há uma semana, o cabo Ângelo Marcos Rocha de Souza não estava em casa, ao seu lado. Eles eram parceiros há quase dez anos, desde que o pastor alemão debutou no programa de resgate de vítimas do Grupo de Operações de Socorro Tático (Gost) do Corpo de Bombeiros do Paraná. O cabo participava da certificação de outro cão do programa, em Santa Catarina. Tão logo retornou a Curitiba, começaram as homenagens.
Lost nasceu em 13 de novembro de 2006 e se dedicou ao Corpo de Bombeiros por quase toda a vida. Desde 2013, vivia os louros da aposentadoria, sossegado, e dividia uma casa com o cabo. Deixou de ser cão de resgate para virar cão de guarda. O animal faleceu na última quarta-feira (9), foi sepultado e cremado com honrarias na cidade de Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba. Ele foi pioneiro em missões de busca e resgate no Paraná e atuou em diversos estados brasileiros.
Os dados do Gost são incertos, mas desde 2006, quando o programa de cães começou, centenas de pessoas foram ajudadas pelos trabalhos de Lost. Além disso, pelo pioneirismo, ele ajudou a treinar dezenas de oficiais Brasil afora, além de ter sido parte da Força Nacional por seis anos.
“Em 2007, Lost e Ângelo fizeram um Curso de Busca, Resgate e Salvamento com Cães em Brasília. Ele também esteve na Força Nacional até 2012 e participou de missões ao longo de todo o território nacional. Uma das mais importantes foi no Piauí, em 2009, quando houve o rompimento da Barragem de Algodões, no município de Cocal. Outra missão delicada foi na cidade de Sengés, aqui no Paraná, quando pessoas ficaram ilhadas”, explica o 2.º tenente Luiz Henrique Vojciechovski, da Comunicação Social do Gost.
Lost foi eternizado no Corpo de Bombeiros como mascote de um programa social do Gost no atendimento de crianças em tratamento de câncer. Ele inclusive virou modelo de pelúcia, espécie de “Simba das araucárias”. No Facebook, a nota de luto do Corpo de Bombeiros recebeu 865 interações e 369 compartilhamentos.
Segundo Vojciechovski, o cabo Ângelo ainda está muito abalado com a notícia e preferiu não dar entrevista. “Lost era um símbolo para a nossa corporação. O Paraná é pioneiro nesse programa de auxílio de cães para resgate de vítimas. E o Lost é pioneiro desse programa. Sem ele nada teria sido possível”, conta. “Agora, depois da aposentadoria, os dois eram parceiros em casa e tinham uma ligação muito forte. Ligação de treinador e cão. Nós lemos uma mensagem para o Lost antes da cremação. Ele era um cão especial”, destaca.
Programa
Atualmente, sete cães participam do programa. Eles são de diversas raças, como bloodhound, labrador, golden retriever e pastor alemão. Treze se formaram desde o início, em 2006. Segundo o Gost, Lost foi o primeiro cão que trabalhou com serviço de busca em situações reais. Em média, nos últimos anos, são quatro ocorrências por mês – sem contar o reforço em operações mais convencionais da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros.
As últimas grandes missões de resgate ocorreram em Manfrinópolis, em dezembro de 2015, depois de uma forte enxurrada, e em Rolândia, no rompimento de uma barragem. O centro de operações fica em Curitiba e os cães estão de plantão para, em no máximo três horas, se deslocar para qualquer lugar do estado.
A atuação deles ocorre em dois níveis: venteio e rastreio. No venteio, o que chama a atenção dos cães são os odores da decomposição das células. “Cada pessoa tem um odor, característico da decomposição das células, da decomposição corporal. Os cães percebem esse odor em lugares que não seriam convencionais. Essa é a busca”, explica Luiz Henrique Vojciechovski, da Comunicação do Gost. “Já a técnica do rastreio é a seleção de odores. Igual aos filmes. Nós oferecemos uma peça da roupa da pessoa desaparecida, algo nesse sentido, e o cão passa a procurar com um foco específico”.
Também são duas modalidades: rural e urbana. Os rastreamentos com cães ocorrem em cobertura vegetal de risco e em estruturas colapsadas.
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