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O assassinato de uma testemunha e o espancamento de outra provocaram a paralisação de uma investigação do Ministério Público Estadual (MPE) que apurava os contratos da São Paulo Transporte (SPTrans), empresa da Prefeitura, com nove companhias de lotação da capital. Formadas por antigos perueiros, as empresas são suspeitas de ligação com o Primeiro Comando da Capital (PCC).

Polícia e MP devem investigar o crime organizado, diz secretário

O secretário municipal de Transporte, Jilmar Tatto, disse à promotora Karyna Mori que “a responsabilidade de apurar crime organizado é da polícia e do Ministério Público”. Na quinta-feira (14) reafirmou a opinião ao jornal O Estado de S. Paulo, ao dizer que a Prefeitura não tem a obrigação de impedir a infiltração de facções criminosas na operação dos ônibus da capital paulista.

Tatto disse que a Prefeitura abriu mão de contratar as cooperativas e decidiu passar a gestão da frota para as novas empresas atendendo a um pedido das cooperativas. “Elas falaram que queriam virar empresas.” O secretário disse que uma auditoria nas contas do sistema de transporte também recomendou que a Prefeitura optasse por não usar serviços de cooperativas. Tatto alegou ainda que as novas empresas tinham capacidade técnica necessária para operar o sistema. “Tanto que o sistema não parou.”

Nota enviada por uma das empresas investigadas pelo Ministério Público Estadual contradiz o secretário: “A Transwolff informa que foi convidada pela SPTrans a assumir o contrato emergencial de operação do transporte coletivo em parte da zona sul de São Paulo, na área onde antes operava a Cooper Pam, e apresentou todos os documentos solicitados, entre eles a comprovação de que já presta o mesmo serviço de transporte coletivo no interior do Estado”. A Transwolff não foi relacionada a nenhum dos casos de violência citados pela promotoria, mas também é investigada.

Tatto afirmou que o momento atual é de transição e que o sistema de transporte poderá ser assumido por outras empresas, uma vez que a Prefeitura assumiu um dos maiores custos do setor: a propriedade das garagens. “Vai poder vir gente (empresas) de fora”, disse Tatto.

Violência

A reportagem tentou, durante toda a tarde de quinta-feira, localizar representantes das empresas Allianz, que ficou no lugar da Cooperativa Paulistana, e da Viação Transcap, antiga Unicoopers, que são citadas nas investigações sobre os casos de violência contra as testemunhas, mas nenhum deles foi encontrado.

O objetivo do MPE era verificar supostas fraudes em contratos da Prefeitura com as empresas, que não teriam capacidade técnica nem financeira para operar as frotas de lotações na periferia da cidade. Indícios apontavam para o uso das empresas para lavagem de dinheiro do crime organizado.

Uma das testemunhas que colaboravam com as investigações havia dito que os novos patrões estavam retendo parte dos pagamento que a Prefeitura fazia ao sistema. Dessa forma, os cooperados tinham prejuízo e se viam obrigados a vender seus veículos. As novas frotas, que cresciam aos poucos, serviriam para dar capacitação técnica às empresas na disputa da futura licitação do transporte público do Município - o que vai ocorrer no mês que vem.

O primeiro ataque contra uma das testemunhas do MPE aconteceu no dia 6 de fevereiro. O perueiro Sérgio da Conceição Nobre de Oliveira, de 36 anos, estava na Rua Joaquim Marra, na Vila Matilde, zona leste, quando foi alvejado. O lugar fica próximo de uma das garagens da empresa Allianz (antiga Cooperativa Paulistana). “Eu ia ingressar com a ação dele. Já tínhamos conversado e ele estava disposto a colaborar com o Ministério Público”, afirmou o advogado André Luis Lopes, que representa perueiros supostamente prejudicados.

O segundo episódio aconteceu no dia 8 de abril. Eram 23h40, quando outra testemunha foi atacada. Ela - cujo nome é mantido em sigilo - foi abordada por um homem mascarado quando voltava do trabalho para casa. “Sem dizer nada, ele partiu para cima”, disse a testemunha, em depoimento ao MPE.

O criminoso deu um soco na têmpora da vítima, jogando-a contra um tanque de roupas. A surra continuou, até que os gritos da testemunha fizeram pessoas se aproximarem. O agressor se afastou. Entrou em um carro que o aguardava e fugiu.

Ao denunciar o ataque ao MPE, dois dias depois, a testemunha contou que a surra aconteceu depois que ela havia tentado denunciar as pressões contra os perueiros em uma audiência pública da Prefeitura para a apresentação do edital do novo sistema de transporte. A vítima afirmou que foi ameaçada pelo dirigente de uma das empresas: Valter Bispo. O nome dele consta como representante da empresa Transcap no contrato com a Prefeitura. Diante do caso, o MPE pediu a inclusão da testemunha no Programa Estadual de Proteção a Vítimas e Testemunhas (Provita). Ela não está mais na cidade.

A promotora Karyna Mori, da 6ª Promotoria do Patrimônio Público e Social da cidade, responsável pela investigação, disse que, depois desse episódio, não teve mais como continuar as investigações sobre a fraude.

Segundo perueiros ouvidos pela reportagem, Oliveira teria sido um dos primeiros a rebelar-se contra a falta de pagamentos por parte das novas empresas e ameaçava ir à Justiça. Entre os perueiros, circula um vídeo de sua morte. As imagens mostram a vítima ensaguentada.

Desdobramentos

“Só me resta, agora, acompanhar o edital e a licitação do transporte para tentar identificar algum favorecimento às empresas, uma vez que, sem testemunhas, fico restrita à análise burocrática”, disse a promotora. Por meio da assessoria de imprensa do MPE, o Gaeco confirmou que investiga os casos acompanhados por Karyna na área civil.

O MPE tem documentos que ligam a alta cúpula da facção criminosa PCC com a operação das peruas. A morte de Oliveira é investigada por um inquérito aberto pelo 21.º Distrito Policial (Vila Matilde).

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