Se você é uma das pessoas que marcaram uma horinha com o empreendedor Ricardo Dória – e pelo menos uma centena deve ter planejado uma conversa com ele entre os propósitos de 2016 – prepare-se. Dória é adepto de reuniões em cafés da manhã, almoços e lanches de fim de tarde. São seus momentos para desopilar a agenda – impossível tentar encaixar “uns minutos” no meio do expediente. Mais. Ao chegar, não espere encontrá-lo sozinho, a bordo de um fumegante chá de ervas tibetanas, colhidas pelo próprio. É quase certo que vai estar cercado de pessoas, todas convocadas para o mesmo horário. De propósito.
“Antes era o peixe grande comendo o peixe pequeno. Hoje o peixe rápido come o peixe lento”
Se o interessado sai sapateando, não se sabe, mas é certo que se vê apresentado a uma constelação de redes – das sociais às profissionais, passando pelas inventivas e sonhadoras. Essa é a intenção. O espírito coletivo encarnou em Ricardo. Vale para tudo. Tem sido assim nos últimos cinco anos, tempo em que o então jovem publicitário da renomada Opus Múltipla deu baixa no RH e fundou em Curitiba a primeira coworking – aqueles espaços de trabalho que abrigam dezenas de tribos debaixo do mesmo teto, sem que troquem tiros.
Ricardo Dória não é o único representante da economia criativa na capital, longe disso. Mas virou um sinônimo da tendência, de modo que se alguém disser seu nome, ainda que no ouvido, vai desencadear uma outra rede – a dos que escutaram falar do rapaz ,de dicção a mil, corado, atarefado e sarado, que corre na rua, faz musculação, surfa e, de sola, se tornou referência num assunto que até então parecia estar no âmbar dos filmes de Frank Capra: a felicidade. É tema de um de seus cursos. E lota.
Tudo começou com uma desistência. Aos 17 anos, calouro de Engenharia Civil na Universidade Federal do Paraná, Ricardo se preparava para seguir a profissão do pai – Eduardo, engenheiro da Copel. Amou o astral neo hippie da UFPR, mas odiou o curso, o que por pouco não lhe custou o juízo. “Era difícil acordar, entende? Me senti uma fraude. Comecei a achar que não ia dar certo. Que ia virar mendigo”. A frase desperta gargalhada – mas ele reforça. “Eu me pelava. Superei o medo. Hoje acho que se não rolar, dane-se, já me diverti pra caramba.”
Não bastasse – veio uma segunda desistência. Da Engenharia, Ricardo migrou para a Publicidade e de lá para a fama instantânea – um enfant terrible do mercado, a quem os colegas viam sendo disputado a tapas por Serpas e Nizans. Mal sabiam seus pares que ele não só não queria o Leão de Cannes como não via a menor graça na estrutura das agências de publicidade. Considerava-as com mal de raiz – “estrutura errada, divisão de dinheiro errada, distribuição de motivação errada...”.
Em segredo, imaginava “uma agência que não tivesse dono”. Passou a estudar o conceito de escritório cooperativo, uma onda que fervia em centros como Nova York e São Paulo. Até que bateu com a língua nos dentes. Um erro de edição do jornal Gazeta do Povo se encarregou do resto. Ao dar uma entrevista sobre o assunto, surpreendeu-se ao ler na reportagem que não só Curitiba ganharia sua primeira coworking como ela seria assinada pelo menino prodígio Ricardo Dória. “Achei muito massa. Me empurrou. Sou grato.”
Ao ouvi-lo contar o episódio, dá para imaginar a saia-justa na agência, dia seguinte, e o sorriso amarelo tão logo fez as primeiras contas. “Percebi que minha proposta não era sustentável”, lembra, o que só piorou nas semanas entre o pedido de demissão e a abertura da Aldeia Coworking, então na Galeria Suíssa, no Centro de Curitiba.
A maioria dos 250 candidatos a uma “baia” amarelou. Só sete permaneceram. Permutas, a rodo. Dinheiro, em gotas. Talvez só lhe restasse mesmo um cobertorzinho de campanha, destes distribuídos pela Fundação de Ação Social, a FAS, como suspeitava. “Eu só respirei seis meses depois, quando conseguimos cobrir as despesas”. Passado um ano e pouco, lançava-se em mais um empreendimento – A Grande Escola. Desse momento em diante, passou de empreendedor em apuros a Ricardo Dória – o sujeito com quem todo mundo quer trocar ideias. Não é difícil entender por quê.