O cartunista Glauco Villas Boas, 53 anos, morto a tiros na madrugada desta sexta-feira (12) em sua casa em Osasco, na Grande São Paulo, foi atingido quando tentava impedir o suspeito do crime, Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, de se matar, segundo informações da Polícia Civil. Raoni Villas Boas, de 25 anos, filho de Glauco, também foi morto. O suspeito, de 24 anos, é procurado pela polícia.
Anteriormente, a Polícia Civil havia dado uma versão diferente dos fatos. No boletim de ocorrência registrado no 1º Distrito Policial de Osasco, consta que três homens atiraram em Glauco e no filho dele na Estrada de Portugal. O boletim, de homicídio simples, não deixa claro se o crime foi na casa do cartunista ou perto dela. Ainda segundo o registro, uma terceira pessoa estava com as vítimas, mas não foi atingida.
O crime teria acontecido durante uma discussão entre o suspeito e o cartunista. Segundo o delegado do Setor de Investigações Gerais (SIG) da Delegacia Seccional de Osasco, Archimedes Cassão Veras Júnior, o suspeito era conhecido da família e tinha acesso à residência. "Todas as testemunhas apontam que essa pessoa discutiu com o Glauco", disse o delegado.
Veras Júnior ainda contou que os tiros foram dados no terreno do imóvel onde Glauco morava com a família. Em um primeiro momento, o suspeito teria apontado a arma para a própria cabeça. Ao tentar impedir que ele atirasse, o cartunista foi atingido. Em seguida, seu filho também foi alvejado.
O cartunista havia fundado a Igreja Céu de Maria, que era inspirada nos cultos do Santo Daime e funcionava na mesma comunidade.
Segundo a Agência Estado, o suspeito do crime vive no Alto de Pinheiros, na Zona Oeste de São Paulo, e estava afastado dos cultos havia cerca de seis meses. No fim da noite de ontem, ele teria ido ao encontro de Glauco e Raoni, levando uma pistola 765.
De acordo com o delegado, a família ouviu uma discussão durante a noite e foi para fora da casa verificar o que estava ocorrendo. Vizinhos também presenciaram a confusão.
Segundo o major Isaías Vieira, da Polícia Militar, pouco antes da discussão estava sendo realizado um culto no local, na noite de quinta-feira (11). O suspeito dos crimes teria pedido para falar com o cartunista e com o filho Raoni. Uma discussão teria começado e o homem atirou em Glauco e em seguida em Raoni, fugindo logo em seguida num carro cinza.
Glauber Salzano, que é zelador do condomínio onde Glauco morava, afirma que o suspeito de ter matado o cartunista e o filho frequentava a Igreja Céu de Maria. "Ele [o acusado] buscava a igreja em torno de um caminho, mas tem espírito que é assim mesmo...", disse.
Ainda segundo a polícia, Raoni levou quatro tiros no tórax e no abdome. Três deles transpassaram o corpo do jovem e um ficou alojado. Glauco também foi baleado quatro vezes. Um tiro acertou o lado direito do rosto, entrou pela bochecha e ficou alojado. Os outros três atingiram o abdome e o tórax e atravessaram as costas do cartunista.
Terceira versão
Outra versão foi dada pelo advogado da família do cartunista, Ricardo Handro, ao G1. Segundo ele, dois homens invadiram a casa de Glauco Villas Boas. Eles estavam aparentemente drogados. "Eles não falavam coisa com coisa, estavam aparentemente drogados. Mais que advogado da família, sou amigo de Glauco há 12 anos. Foi uma fatalidade, uma coisa terrível", disse.
Segundo Handro, os homens renderam a filha do cartunista quando ela tentava entrar em casa. Eles entraram na residência e anunciaram que levariam toda a família. Glauco negociou para que apenas ele fosse levado. Durante a negociação, o cartunista levou uma coronhada no rosto.
"Não posso dizer que o boletim está errado, mas o que aconteceu foi isso. São informações que a família me passou", disse Handro ao chegar no Instituto Médico-Legal (IML) de Osasco, na manhã desta sexta.
Ainda nessa versão, o filho Raoni chegava da faculdade quando o cartunista era levado pelos assaltantes. Ele teria se assustado com o pai sangrando e com uma arma apontada para a cabeça. Raoni tentou negociar e, neste momento, foi atingido por quatro tiros. Outros quatro disparos foram dados em direção ao cartunista. Um dos tiros acertou o rosto do cartunista. A mulher e a filha de Glauco presenciaram tudo.
Glauco e Raoni chegaram a ser levados para o Hospital Albertin Sabin, na Lapa, Zona Oeste de São Paulo, mas chegaram mortos ao local. Até as 11h desta sexta, os corpos continuavam no IML de Osasco. Ninguém foi preso, segundo a polícia.
Assim que forem liberados pelo IML, os corpos de Glauco e Raoni deverão ser velados na casa da família, na Estrada de Portugal. O enterro deve acontecer no Cemitério Anhanguera. Ainda não foi definido o horário do sepultamento. Glauco Villas Boas nasceu em Jandaia do Sul, no Paraná, em 1957. Como cartunista, publicou seus primeiros trabalhos em 1976, no "Diário da Manhã" de Ribeirão Preto, e, em 1977, ganhou seu primeiro prêmio no Salão do Humor de Piracicaba.
No início da década de 1980, passou a fazer parte do elenco de cartunistas do jornal "Folha de S. Paulo", onde consagrou personagens como Geraldão, Geraldinho, Dona Marta, Zé do Apocalipse, Casal Neuras e Doy Jorge.
Dono de um traço marcante e de um estilo de humor ácido e de piadas visuais rápidas, Glauco criou personagens que de certa forma representavam suas próprias experiências na São Paulo dos anos 1980, com referências a sexo, drogas e violência urbana.
Em 1991, participou ao lado de Angeli e Laerte da criação da tira "Los 3 amigos", uma brincadeira do trio de cartunistas com o universo dos filmes de bang-bang e seu retrato dos personagens mexicanos.
Atualmente, Glauco publicava tiras diárias e charges no jornal "Folha de S. Paulo". Seus quadrinhos antigos vinham sendo republicados por editoras como Opera Graphica e L&PM.
Em uma entrevista publicada na "Folha de S. Paulo" em 2004, Glauco lamentou a suposta falta de sintonia com as novas gerações. "Meu traço não é bom para retratar o futuro. Corro o risco de não falar a língua da moçada."
Glauco também fez parte da equipe de redatores dos programas "TV Pirata" e "TV Colosso", da Globo.
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