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cultura da violência

Policiais relatam “pressão” para matar

 | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
(Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo)

Desde o seu primeiro dia na corporação, o policial Roberto* sentiu uma “pressão explícita para matar”. Ouvia piadas dos colegas e cobranças sobre quando seria seu “batismo de sangue” – primeira morte provocada pelo agente em serviço. Sentia-se intimidado. Sete meses depois, fez a primeira vítima: um suspeito que desobedeceu a ordem de parar para ser abordado.

“Foi uma morte completamente evitável. Ele estava acuado, rendido. Mesmo assim eu atirei”, disse. “Você pensa que tirou uma vida, mas ao mesmo tempo você se sente poderoso e valorizado. Tem todo o discurso na corporação de que você matou um tralha, que fez uma limpeza. Para a sociedade, quanto mais gente com perfil de bandido ‘pular’ [morrer], melhor. As pessoas se sentem vingadas”, completou.

Além de Roberto*, que serviu às polícias Militar e Civil, outros dois agentes ouvidos pela Gazeta do Povo relataram sensação semelhante: de que há nas corporações uma inclinação à letalidade, respaldada pelo corporativismo e potencializada por uma parcela da sociedade. “Não é a polícia que é violenta. É a sociedade. A polícia é só o braço armado da sociedade, que legitima essas mortes”, disse o policial civil Tiago*, que participou de dois confrontos que terminaram em morte.

Para os policiais, as falhas no sistema de persecução penal ampliam a aceitação da sociedade à letalidade policial e leva os agentes a crer na “justiça pelas próprias mãos”. “Se o policial não crê na Justiça, ele tende a matar com mais facilidade. Ele justifica pra si mesmo que é um ato de nobreza, mas, muitas das vezes, não passa de um ato covarde de execução”, apontou o policial militar Ricardo*.

Os agentes ouvidos pela reportagem, no entanto, reconhecem que a execução de suspeitos está longe de resolver os problemas estruturais de segurança, mas que apenas mascaram a realidade. “É igual a música da mosca: você mata uma e vem outra em seu lugar. Você vai ficar matando a vida inteira?”, questiona Tiago*.

“Por exemplo, se uma equipe mata um traficante que está passando drogas em vez de prendê-lo, ela está queimando a possibilidade de chegar aos grandes. Essa prisão seria muito mais eficiente à segurança. Vamos continuar matando os peixes pequenos?”, aponta Roberto*.

*Nomes fictícios.

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