O caso do menino Miguel Gutbier, de 8 anos, que morreu na tarde de quinta-feira aguardando um transplante de coração, expôs a situação de milhares de pessoas que contam com a solidariedade para sobreviver. Desde 2005, o número de transplantes de órgãos e córneas tem aumentado, mas não o suficiente para acabar com qualquer fila. Só no Paraná, mais de 4,6 mil pessoas terminaram o ano passado à espera de um doador. O transplante renal é o que apresenta mais pacientes à espera, são 2,5 mil pessoas.
De acordo com o médico e professor de anatomia da Universidade Federal do Paraná, Eduardo Brommelstroet Ramos, membro da equipe de transplante hepático do Hospital de Clínicas, a fila de espera por doadores é muito grande e a cada dia ganha novos pacientes. Para reverter a situação, ele aponta alguns problemas a serem resolvidos. "Existe a falha na área médica, que peca em não avisar imediatamente a Central de Transplantes quando há um potencial doador. Há também a abordagem com a família, que pode ser ineficiente, e a falta de conhecimento da população, que não sabe que pode ser doadora", diz. Em cada hospital com mais de 80 leitos, a responsabilidade de entrar em contato com a família de um possível doador é da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes. Ela é formada por membros do próprio hospital, treinados para esclarecer todas as dúvidas dos familiares. (Conheça mais sobre o processo da doação em quadro nesta página.)
Embora existam campanhas nacionais pela doação de órgãos, especialistas afirmam que elas não surtem o efeito necessário. O principal motivo seria a falta de continuidade na divulgação das campanhas, que ocorrem esporadicamente. De acordo com a médica Fabiana Loss de Carvalho Contieri, coordenadora da unidade de transplante renal do Hospital Evangélico, mesmo com o Brasil ocupando a segunda posição entre os países que mais realizam transplantes, ainda há muito o que fazer para concretizar a cultura da doação no país. "O que temos hoje são casos pontuais de doações de órgãos. Após a mídia divulgar casos como o da menina Eloá Pimentel, que teve seus órgãos doados em São Paulo, temos um acréscimo nas doações. Mas assim que o caso é deixado de lado, os números caem novamente", afirma.
Prevenção
A melhor maneira de tentar acabar com a fila de espera é diminuir o número de pessoas que necessitam de novos órgãos. Em alguns casos, a medicina preventiva é o caminho para cuidar da saúde e tentar se manter longe dos transplantes. Segundo Fabiana, falta conscientização das pessoas a respeito dos cuidados com a saúde. "Há vários exames que podem ser feitos para evitar problemas graves no futuro. Mas essa consciência depende das condições do paciente e da proximidade que ele tem com unidades de saúde. No caso das doenças renais, muitos chegam ao pronto-socorro já com insuficiencia renal terminal. Aí há pouco para ser feito", diz.
Ramos lembra que alguns cuidados com a saúde também contribuem para evitar maiores problemas. "Deve-se evitar a ingestão de bebidas alcoólicas, tomar as vacinas necessárias, como a contra a hepatite B, controlar da hipertensão arterial e sempre fazer os exames de rotina", afirma. Ele ressalta que, mesmo que a pessoa tenha tido vários problemas de saúde, ainda há chances de se tornar um doador após a morte. "Cabe a equipe médica avaliar e direcionar o que puder ser aproveitado", diz. A doação de órgãos feita por doadores cadáveres só é considerada após ser constatada a morte encefálica. No caso de doadores vivos, a doação pode ser feita para parentes de até 4° grau, ou com autorização judicial, no caso de não parentes.
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Interatividade
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