Uma quadrilha foi presa nesta terça-feira (14), no Rio de Janeiro, sob suspeita de praticar abortos no Rio há pelo menos 42 anos, desde 1972. O grupo atendia a mulheres do Rio de Janeiro e de outros estados, muitas vezes em locais sem condições mínimas de higiene e salubridade. Cada aborto chegava a custar R$ 7,5 mil e depois ocorriam "revisões médicas", para que as mulheres atendidas não tivessem os abortos descobertos em postos de saúde. Entre os membros da quadrilha estão quatro policiais civis, dois policiais militares, um bombeiro e um militar do Exército. Advogados também estariam entre os membros do bando.

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A operação para desmantelar a quadrilha começou na manhã desta terça. Até a última atualização de dados, no fim da tarde, 56 pessoas tinham sido presas. Entre os detidos há três médicos – outros sete estão foragidos. Ao todo, a Justiça expediu 75 mandados de prisão. Uma das médicas presas nesta terça já havia sido denunciada em 2001. Na época, havia informações de que ela teria feito mais de 6 mil abortos.

"Os médicos que estão sendo presos hoje são açougueiros humanos. Eles matam como se estivesse matando bezerros", disse o delegado Glaudiston Galeno, da Corregedoria Interna da Polícia Civil do Rio. Além de médicos, as investigações apontam que a quadrilha é composta por policiais civis e militares, advogados, um bombeiro e um militar do Exército.

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Medicamentos, uma série de documentos e R$ 532 mil em dinheiro, entre notas de reais e dólares, também foram apreendidos.

Na casa do médico Aloísio Soares Guimarães, apontado como um dos chefes da quadrilha, foi encontrado um extrato de uma conta na Suíça com pelo menos US$ 5 milhões.

Os integrantes da quadrilha vão responder por corrupção passiva, prevaricação, exercício ilegal da medicina, associação para o tráfico de drogas, corrupção ativa e associação criminosa armada.

O esquema

De acordo com os policiais da Corregedoria, a quadrilha era dividida em sete núcleos, cada um com uma clínica, a maioria delas com endereço fixo. Diversos integrantes da quadrilha têm passagem por dois ou mais núcleos. "As clínicas eram independentes, cada uma com área de atuação bem definida e não competiam entre si, até porque a demanda era maior do que a oferta. Algumas clínicas chegavam a limitar a quantidade de abortos por dia", disse a polícia.

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A quadrilha agia na capital e poderia estender a atuação para cidades da Região Metropolitana Fluminense. Menores de idade pagavam mais caro e os valores poderiam chegar a R$ 7,5 mil por procedimento, dependendo da fase da gravidez. Nas investigações, os policiais identificaram que uma menina de 13 anos foi submetida a um procedimento abortivo. Também há casos de mulheres que passaram por microcirurgias em abortos tardios (até sete meses de gestação).

Cada núcleo faturava até R$ 300 mil por mês. Somente na clínica de Bonsucesso, os policiais encontraram documentos que identificam cerca de dois mil abortos realizados entre outubro de 2012 e esta terça. A receita acumulada ultrapassa os R$ 2,7 milhões.

"A sensação de impunidade e a alta lucratividade fazia com que eles continuassem com os procedimentos abortivos", explicou o delegado Vale.

Grávidas de outros Estados também eram atendidas, sempre em locais sem condições mínimas de higiene e salubridade, expondo a integridade física e a saúde das mulheres. Alguns procedimentos eram realizados nas casas de integrantes da quadrilha para dificultar o trabalho policial. Depois de realizado o procedimento, eram feitas revisões médicas para que as mulheres não procurassem clínicas públicas ou particulares em caso de complicação, pois o aborto poderia ser constatado.

Operação

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Ao todo, serão cumpridos 75 mandados de prisão preventiva e 118 de busca e apreensão. Até agora, 37 mulheres denunciaram os procedimentos ilegais. Todos os envolvidos serão denunciados por estes 37 procedimentos. "A legislação ainda vê essas mulheres como criminosas, mas há mecanismos jurídicos para que aquelas que cometeram aborto e querem contribuir com as investigações não respondam criminalmente". Essas mulheres não estão entre as denunciadas e a polícia pediu que elas recebam perdão judicial.

A investigação que deflagrou a Operação Herodes durou 15 meses e gerou um inquérito policial com 56 volumes e 14.108 páginas.

Participam 70 delegados, 430 agentes da Polícia Civil, 150 viaturas e apoio da Corregedoria Geral Unificada (CGU), da Corregedoria Interna da Polícia Militar e do Exército Brasileiro. Há equipes atuando também no Espírito Santo e em São Paulo para cumprir os mandados expedidos pela 4ª Vara Criminal da Comarca da Capital.