Ao menos 363 motoristas são autuados por mês no país por participar de rachas de veículos. Neste ano, só até junho, o Registro Nacional de Infrações (Renainf), ligado ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), já registrou 2.179 casos, média maior do que nos dois anos anteriores 327/mês, em 2015, e 282/mês em 2014. Minas tem o maior número absoluto de autuações: só neste ano, foram 259.
Os dados, obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação e em pesquisas em boletins de ocorrência de São Paulo, podem estar subnotificados, já que não foram consideradas todas as autuações por alta velocidade. Para o levantamento, só foram somados os dados de duas violações do Código de Trânsito Brasileiro (CTB): “utilizar veículo para demonstrar ou exibir manobra perigosa mediante arrancada brusca ou derrapagem com deslizamento de pneus” e “disputar corrida”.
A prática do racha é ilegal e pode levar a até 10 anos de prisão, apreensão do veículo, multa e suspensão da carteira nacional de habilitação.
Praticantes, muitas vezes, divulgam vídeos dessas competições no YouTube e em outras redes sociais. Os eventos são avisados por meio do Facebook e do aplicativo WhatsApp.
Um dos vídeos, publicado em abril, mostra um grupo de jovens tomando cerveja e ouvindo funk em um posto de gasolina na Avenida do Estado, enquanto acompanham a “largada” da corrida. Em outro, publicado no mês passado, o autor da publicação registra a disputa entre um Classic 1.0 e um Honda Fit 1.4.
Perfil
Os rachas não se restringem à “alta classe” de veículos. Dados levantados pela reportagem nos boletins de ocorrência registrados em São Paulo mostram que a polícia apreendeu de um BMW 335I 2012, que pode custar cerca de R$ 160 mil, até um Gol CLI 96, de R$ 8.400, nessas disputas. O perfil predominante dos participantes é de homens, de 17 a 35 anos.
Mas há exceções: no mês passado, policiais militares autuaram um homem de 61 anos por participar de um racha na Rodovia Raposo Tavares, com um Land Rover Evoque Dynamic, avaliado em R$ 165 mil.
As características dos veículos, que geralmente têm o motor adulterado para participar das competições, são uma forma de a polícia diferenciar os acidentes comuns de rachas. Mas nem sempre isso é possível.
Em maio do ano passado, um veículo Chevrolet Camaro em alta velocidade atingiu uma árvore na Avenida das Nações Unidas, sentido Jaguaré. As vítimas, motorista e passageiro, foram levadas para o Hospital das Clínicas. Uma delas, um empresário de 38 anos, quebrou a clavícula e a outra, de 23 anos, morreu.
As investigações do 11.º DP concluíram que o carro havia sido adulterado e, por isso, há suspeita de que houve racha. Mas o caso segue sem esclarecimento. No boletim de ocorrência, o registro é de “lesão corporal culposa na direção de veículo automotor”. “O problema desses casos é que, dependendo da justificativa do motorista e das características do acidente, não se pode configurar como racha. É preciso buscar imagens, testemunhas que possam provar que houve, de fato, a disputa”, explica a delegada Luciara de Cássia.
Cultura
Para o médico Dirceu Rodrigues Júnior, diretor da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), falta presença ostensiva de policiais na região dessas disputas ilegais. “Todos conhecem os pontos de racha. Só a presença do policial nesses pontos já inibiria a realização desse tipo de evento”, diz.
Ele destaca ainda a necessidade de se implementar a educação de trânsito nas escolas. “O sujeito adquire a primeira CNH, um passaporte para a maioridade, e passa a experimentar aquilo que já vivenciava na infância: a competição com os colegas. Ele traz uma fantasia da infância para a vida adulta. É preciso mudar essa cultura”, afirma.
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