Como chefe da Casa Civil, José Dirceu (PT-SP) recebeu em audiência no Planalto, em 11 de janeiro deste ano, o banqueiro português Ricardo Espírito Santo, do Banco Espírito Santo, acompanhado do empresário mineiro Marcos Valério de Souza. Ao GLOBO, Ricardo Espírito Santo confirmou a audiência e informou que foi Valério quem se ofereceu para apresentá-lo a Dirceu. Anteontem, em depoimento no Conselho de Ética da Câmara, Dirceu negara peremptoriamente qualquer envolvimento em supostas negociações com a Portugal Telecom, da qual o Banco Espírito Santo é um dos principais acionistas. A reunião aconteceu 13 dias antes da viagem de Valério e do tesoureiro informal do PTB, Emerson Palmieri, a Portugal. No depoimento, Dirceu omitiu o encontro ao ser perguntado se já estivera com Valério:
- Eu o conheci (Marcos Valério) em alguma atividade social. Ele esteve na Casa Civil acompanhando a direção do Banco Rural umas duas vezes - disse.
Segundo o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), Valério e Palmieri viajaram a Lisboa para tentar fechar negócios com a Portugal Telecom em troca de um acordo que resolvesse as dívidas do PTB e do PT. O Banco Espírito Santo é um dos maiores acionistas da Portugal Telecom.
Agendas da Casa Civil confirmam
O encontro está registrado na agenda oficial de Dirceu na Casa Civil. A reunião foi marcada para as 17h e teria durado meia hora. Procurado pelo GLOBO, Dirceu confirmou que recebeu o banqueiro Ricardo Espírito Santo e que ele estava acompanhado de Valério. Mas deu outra versão para o encontro. O ex-ministro não soube dizer por que Valério participou da audiência. Segundo ele, Valério estava prestando serviços ao Banco Espírito Santo:
- Recebi o banqueiro Ricardo Espírito Santo no meu gabinete. Ele estava acompanhado de Marcos Valério. Mas não foi Valério que marcou a audiência. Por que Valério estava com Ricardo Espírito Santo? Quem tem que responder isso é o banco. Ele estava prestando serviços para o Banco Espirito Santo, mas não sei muito bem o que era. Recebo todos os representantes de banco que me procuram.
Segundo ele, o Banco Espírito Santo foi comunicar interesses em novos investimentos. Dirceu disse que não teve qualquer tipo de negociação com o banqueiro e que todas as suas audiências eram formais e protocolares.
Encontro também em Portugal
A agenda disponível no site da Casa Civil confirma: além de ter recebido o presidente do Banco Espírito Santo, Dirceu esteve em Lisboa no dia 7 de junho passado e participou de um jantar com empresários, entre eles Miguel Horta e Costa, presidente da Portugal Telecom.
Durante depoimento à CPI dos Correios, Jefferson afirmou que Valério tentou convencer a direção do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) a transferir parte das reservas técnicas aplicadas em outros bancos europeus para o banco português Espírito Santo. O montante chegaria a US$ 600 milhões. Pela versão de Jefferson, por essa transferência o banco português pagaria comissão para ser dividida entre o PT e o PTB.
Ricardo Espírito Santo negou que tenha feito negócios com Valério, com o governo ou com partidos. Ele também rebateu a afirmação de Dirceu de que Valério prestava serviços a seu banco.
- Nunca fiz qualquer serviço com Marcos Valério. Ele se ofereceu para me apresentar ao ministro Dirceu. Por isso, estava na audiência. No encontro, falamos sobre os projetos do Grupo Espírito Santo no Brasil. Nunca solicitei qualquer tipo de favor ou ajuda do governo. Não trabalhamos com o governo e nem com política. Também não fazemos negócios com o senhor Marcos Valério. Não precisamos de intermediários. O encontro com o ministro Dirceu foi uma reunião de apresentação. De onde conheço Valério? Sei lá como conheci Valério. Foi em contatos sociais - explicou Ricardo Espírito Santo.
Em nota enviada ao GLOBO, Valério informou que não tem conhecimento e não participou de suposta reunião, realizada em janeiro, em Brasília, entre integrantes do governo federal e Ricardo Espírito Santo.
A CPI dos Correios investiga ainda outras tentativas de negócios de Valério com instituições portuguesas. O próprio empresário admitiu que foi a Lisboa para manter conversas com o presidente da Portugal Telecom, Miguel Horta e Costa, em janeiro deste ano, e para fazer prospecção de clientes.
Em nota divulgada ontem, Valério disse que esteve em Portugal, no ano passado, quando visitou o ministro de Obras Públicas, António Mexia. Ele confirmou que Mexia lhe foi apresentado por Miguel Horta e Costa. Mas negou que tenha sido recebido como consultor ou representante da Presidência ou de qualquer órgão governamental brasileiro.
Valério confirmou também que esteve novamente em Portugal, em janeiro, com Emerson Palmieri, para se reunir com Miguel Horta e Costa, que não pôde recebê-lo por problemas de agenda. Segundo a nota, a viagem tinha como objetivo a prospecção de contas de publicidade, uma vez que a Portugal Telecom estaria interessada em adquirir, por meio da Vivo, a Telemig, operadora de telefonia celular de Minas, que é cliente da SMP&B Comunicação e da DNA Propaganda, as duas agências de Valério.
Fontes do Banco Opportunity, controladora da Telemig Celular, informaram ontem ao GLOBO que Valério não falou em nome do grupo para tentar fechar qualquer tipo de negócios. Segundo essas mesmas fontes, em janeiro deste ano, Valério e o Opportunity já estariam em rota de colisão.
Ontem, os deputados Eunício Oliveira (PMDB-CE) e Miro Teixeira (PT-RJ), que foram ministro das Comunicações do governo Lula, confirmaram que participaram de audiências no Palácio do Planalto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente da Portugal Telecom, em 19 de outubro de 2004 e em 21 de janeiro de 2003.
- Nesta audiência, a Portugal Telecom demonstrou interesse em fazer novos investimentos no Brasil - disse Eunício Oliveira.
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