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Depois de ter sido um dos mais ferrenhos adversários do foro privilegiado para ex-autoridades durante o governo Fernando Henrique, o hoje presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), promete colocar em pauta uma proposta de emenda à Constituição que estende o foro especial a ex-ocupantes de cargos públicos, como presidentes, ministros, parlamentares, governadores e prefeitos. Polêmica, a proposta é combatida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que vê no instrumento mais uma brecha para proteger políticos acusados de corrupção, principalmente se o Supremo Tribunal Federal (STF) incluir a improbidade administrativa entre os crimes que dão ao detentor de cargo público direito a recorrer ao foro especial.

Chinaglia disse que mudou de posição porque foi convencido de que o foro não é prejudicial à sociedade, mas não explicou as vantagens de estendê-lo a ex-autoridades.

- Na época me posicionei contrário à extensão do foro privilegiado, mas tenho ouvido ponderações de deputados e juristas que são fundamentadas, mostrando que isso não é ruim para sociedade - disse o petista nesta terça-feira.

Um impacto negativo da extensão do foro especial apontado pelo meio jurídico será o aumento dos processos no Supremo Tribunal Federal (STF), no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e nos tribunais de Justiça, para onde migrarão as ações, dependendo do cargo público em questão. Juristas entendem que os tribunais não têm estrutura nem vocação para apreciar esse tipo de processo, o que pode tornar ainda mais lenta a Justiça brasileira, justamente num momento em que o país discute propostas para acelerar a tramitação de processos e desafogar o Judiciário.

Para o presidente da OAB, Cezar Britto, o foro privilegiado para autoridades no Brasil "sempre foi utilizado no sentido de que não se tenha punição". Segundo ele, se o Brasil quer acabar com a sensação de impunidade e de ineficiência do Judiciário, precisa extinguir de vez com o foro privilegiado. Estender esse instrumento a todos que já ocuparam cargos públicos seria mais um elemento que só ajudaria a estrangular ainda mais o Judiciário.

- Por mais razões que aleguem para justificar a existência dele, a realidade demonstra a sua desnecessidade, porque, se queremos um Brasil que apure as responsabilidades, o foro privilegiado no Brasil não está servindo para apuração dessas responsabilidades. Por isso, o foro privilegiado tem que ser modificado ou ser extinto - afirmou.

Durante o escândalo do mensalão, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ellen Gracie, no entanto, disse que o foro especial para os envolvidos poderia acabar acelerando o julgamento, ao queimar etapas de tramitação dos processos. No entanto, o relator dos processos, ministro Joaquim Barbosa, avisou na época que as ações poderiam se arrastar por anos devido à falta de estrutura do STF para instruir processos.

"O foro chamado privilegiado significa, na verdade, que os acusados têm uma única chance de defesa e uma única chance de absolvição/condenação. Se nós, por exemplo, iniciamos um processo no primeiro grau, há possibilidade de recurso ao segundo grau, ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal", disse a ministra em sua primeira entrevista após tomar posse.

A OAB lembra, no entanto, que na grande maioria dos processos contra pessoas que tinham o foro privilegiado o STF não chegou a um julgamento. A Ordem defende uma proposta alternativa, denominada por Cezar Britto como "foro concentrado". Nesse caso, todos os processos contra autoridades seriam julgados nas varas da Justiça Federal, que dispõem de maior estrutura.

O foro especial tem como objetivo proteger a função pública exercida pela autoridade. Uma vez que a pessoa não está mais no cargo, não haveria justificativa para garantir o foro, já que, nesse caso, não estaria sendo resguardada a ordem jurídica, mas sim um privilégio pessoal, vedado pelo artigo 5º da Constituição, que assegura que haja igualdade entre os cidadãos. O presidente da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Flávio Pansieri, defende o foro para quem está em exercício de função pública porque ele tem como objetivo defender a função pública, e não a pessoa, e não vê justifica para estendê-lo a quem não está mais no cargo.

- É um equívoco estender o foro para ex-autoridades porque o objetivo do foro é a manutenção do estado democrático durante a gestão e, certamente, o governante deve ter o foro para exercer o mandato com lisura. Agora, após o fim do mandato, não deverá possuir mais essa prerrogativa - afirma

Segundo Pansieri, atualmente tramita no Supremo uma ação que pode estender o benefício do foro privilegiado a acusados de improbidade administrativa enquanto estiverem investidos no cargo. O jurista diz que a tendência é que os ministros entendam que os crimes de improbidade são semelhantes aos de responsabilidade, já incluídos pela Constituição entre os que garantem a prerrogativa do foro.

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